Feliz dia da jornalista àquelas que mudaram o olhar da cobertura esportiva

Mulheres vivem momento importante de ocupação das redações e com voz ativa para comentar, questionar e opinar sobre violências que homens praticam contra elas

Final do Campeonato Brasileiro Feminino em 2021 (Foto: Dibradoras)

Neste dia 07 de abril, queremos celebrar um início de mudança de olhar, de posicionamento e de atitude que implementamos na cobertura esportiva que, ao longo desses anos, foi dominada majoritariamente por homens. Quando a comentarista Ana Thaís Matos, poucos dias após o Dia Internacional da Mulher (que, aliás, foi uma grande provação para qualquer uma de nós neste ano) faz uma fala forte em uma bancada de debate esportivo, ela quebra décadas de silêncio e violência que mulheres sofreram (e ainda sofrem) pelo simples fato de gostar e/ou trabalhar com futebol, especificamente.

“Nunca mais uma mulher sofrerá violência no esporte e a vida de um agressor seguirá normalmente. Nunca mais. E essa é a verdadeira e única revolução!”

Fazendo o recorte só do mês de março de 2024, nós vimos: Daniel Alves condenado por estupro, Tite pedindo desculpas pela resposta vazia e covarde que deu durante uma coletiva de imprensa ao ser questionado sobre qual era seu sentimento em relação à condenação de Daniel Alves, o retorno de Cuca ao futebol e suas declarações – agora, de maneira mais estudada e fazendo um mea culpa – sobre a anulação do processo de estupro do qual fez parte na Suíça na década de 1980, e a prisão de Robinho no Brasil pelo crime de estupro cometido na Itália, em 2013.

ESTUPRO. ESTUPRO. ESTUPRO, ESTUPRO. Quatro personagens diferentes do futebol (todos muito vitoriosos, inclusive), três jogadores acusados e um treinador omisso. Essa foi a tônica do mês de março para as mulheres que amam futebol: perceber que nenhum deles se importa com as vidas delas. E mais do que isso: nada abala a carreira de quem sabe pedalar, ganha títulos ou consegue livrar o time da zona de rebaixamento. Tudo isso tem mais valor do que a vida das mulheres.

+ Mudança de posicionamento de Cuca é conquista da luta das mulheres

No caso específico de Cuca, que chegou ao Athlético-PR após saída conturbada do Corinthians (por conta dos protestos de parte feminina da torcida sobre sua condenação por estupro em 1984), a mudança de comportamento foi vista durante uma coletiva de imprensa, quando leu uma carta, finalmente, demonstrando um pouco de arrependimento.

“Eu escolhi me recolher durante muito tempo, mas consegui seguir a minha vida, enquanto uma mulher que passa por qualquer tipo de violência não consegue seguir a vida dela sem permanecer machucada, carrega o impacto para sempre. Eu consegui seguir minha vida. O mundo do futebol e o mundo dos homens nunca tinham me cobrado nada, mas o mundo está mudando e eu acho que é para melhor”, disse o treinador.

Não é de hoje que usamos nosso espaço para apontar as violências que as mulheres sofrem no meio esportivo. Desde 2015, já ouvimos todos os tipos de justificativas para isentar os homens de qualquer tipo de culpa – na publicação abaixo, de 2020, há muitos exemplos. “Feministas”, “mimizentas”, “lacradoras”, “peçam desculpas ao fulano”, “vocês devem ter entendido errado”, “calem a boca”. Tentam nos intimidar há anos, mas resistimos.

E a clara mudança de postura na abordagem desses casos tem a ver com resistência, mas também com quantidade. Hoje, as mulheres vivem um momento importante de ocupação das redações, de conseguirem ter voz ativa para comentar, para questionar, para opinar sobre as violências que os homens praticam – sejam eles jogadores de futebol ou jornalistas. E para além disso: a presença das mulheres em cargos opinativos também exerce certa pressão para que os homens também sejam nossos aliados e tomem partido na construção de uma sociedade menos violenta para meninas e mulheres. É importante a voz feminina ter espaço para falar, mas é essencial que os homens se posicionem e combatam o machismo também.

“Eu queria que não ficasse tanto nas nossas costas, das mulheres. Porque a gente já sofre, não é a gente vai conseguir mudar essa sociedade, fazer a roda girar. Quem vai conseguir fazer isso é quem causa a violência, que são os homens”, opinou a comentarista Rafaelle Seraphim durante o programa “Tá na Área”, em fevereiro deste ano. Mesmo com homens na bancada de discussão, a opinião sobre o caso Daniel ficou a cargo das mulheres.

E se ainda somos poucas em redações, imagine nas áreas mais poderosas do futebol. Presidente de um clube? No Brasil, só há uma na Série A do futebol masculino: Leila Pereira, presidente do Palmeiras e dona da patrocinadora do clube, a Crefisa. Sem entrar no mérito sobre como ela chegou a ocupar esse cargo – talvez usando os mesmos mecanismos que tantos outros homens utilizaram ao longo da história – foi Leila Pereira quem encabeçou o debate sobre violência contra a mulher na CBF durante uma Data Fifa de Seleção Brasileira Masculina.

Enquanto homens se silenciavam diante das condenações de ex-atletas por estupro, Leila, ocupando um cargo temporário, foi a porta-voz da entidade sobre o assunto. “Isso é um tapa na cara de todas nós mulheres, especialmente o caso do Daniel Alves, que pagou pela liberdade. Acho importante eu me posicionar. Cada caso de impunidade é a semente do crime seguinte”, disse, ao Uol, e escancarou a porta sobre o assunto em um ambiente tão masculino e tóxico.

Talvez este tenha sido o melhor mês de março dos últimos 10 anos, não pelos acontecimentos, longe disso. Mas pela ampliação do debate que foi imposto pelas mulheres na cobertura esportiva. E nesse dia 07 de abril, vamos abraçar todas as mulheres que são nossos suportes diários e dizer a cada uma delas: FELIZ DIA DA JORNALISTA!

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