WO na última rodada do Brasileiro feminino expõe descaso do Real Ariquemes com jogadoras

Jogadoras protestaram por estarem com salários atrasados e por não terem estrutura para treinar.

A primeira fase do Campeonato Brasileiro feminino A1 foi encerrada com um episódio amargo e que expõe o descaso de alguns clubes com a modalidade – mesmo na elite. Em protesto por mais de dois meses de salários atrasados e condições precárias de trabalho, as jogadoras do clube se recusaram a entrar em campo contra o Santos, pela 15ª rodada do torneio, na segunda-feira (12). O jogo acabou com a vitória por W.O. das Sereias da Vila.

“Não foi só pela falta de salários, foi muito além. Foi pela falta de respeito, de investimentos, de programação, foi por tudo. Foi pelo descaso com a modalidade e a única forma que a gente encontrou de mostrar isso foi tomando essa atitude”, desabafou uma das jogadoras que não quis ser identificada. “Quem joga futebol nunca quer passar por isso, mas a única forma que a gente encontrou foi ter uma atitude mais drástica para mostrar que as coisas não estão evoluindo em certos lugares”, completou.

Após conquistar o acesso à primeira divisão no ano passado, o Real Ariquemes prometeu mudanças estruturais e de investimento. E as jogadoras acreditaram, afinal ter a oportunidade de disputar a elite do futebol nacional era um sonho da maioria do elenco e poderia ser uma vitrine importante na carreira de muitas dessas atletas. Mas, segundo elas, nada foi cumprido. 

Segundo o relato de algumas das jogadoras, não houve nem mesmo assinatura de contrato com o clube, e o acordo ficou apenas apalavrado. Procurada pela reportagem, a CBF confirmou que, para inscrever atletas no Brasileiro, o Real Ariquemes precisaria apresentar uma comprovação de vínculo com elas, ainda que amador. Isso porque, de acordo com o Artigo 8º do capítulo 3 do regulamento do campeonato,“a contratação de nova atleta pelo clube, seja como profissional ou não profissional, habilita a sua atuação pelo clube no Brasileirão a partir do dia seguinte à data de publicação do seu nome no BID”. 

Clube foi avisado sobre W.O. uma semana antes

Na última terça-feira (6), as atletas do Real Ariquemes comunicaram que não entrariam em campo contra o Santos, pela última rodada da primeira fase do Brasileirão, devido a todos os problemas financeiros e estruturais a que elas foram submetidas pelo clube ao longo do torneio. Apenas na tarde da segunda-feira, próximo ao horário do jogo, a diretoria do Real Ariquemes procurou o elenco, que já estava no vestiário, para tentar entrar em um acordo. Diante de mais promessas, mas ainda sem os salários pagos, as atletas mantiveram a postura e se recusaram a jogar. 

Um dos problemas graves relatados pelas jogadoras do Real Ariquemes ao longo do campeonato foi a alimentação, que precisou ser custeada pelo treinador Paulo Eduardo e pelo coordenador da equipe. “A gente só come bem quando está no hotel (para os jogos fora de casa)”, lamentou uma das jogadoras. Os treinamentos também eram realizados em campo de má qualidade, sem iluminação e faltavam equipamentos, como faixas elásticas usadas nos exercícios físicos e número suficiente de bolas. Os profissionais do clube chegaram a pedir para as jogadoras que levassem materiais próprios para poderem trabalhar.

Segundo as atletas, as únicas coisas que funcionavam eram as fornecidas por meio de parcerias, como a academia de ginástica e musculação. Ainda de acordo com o relato delas, o Real Ariquemes não levou nem a fisioterapeuta nas viagens para os últimos jogos do campeonato, colocando em risco a integridade física das jogadoras, que foram bastante exigidas pelo elenco enxuto – o clube inscreveu apenas 20 atletas na competição nacional. Sabendo da situação, uma delas deixou a equipe na penúltima rodada, após o jogo contra o Atlético Mineiro. 

“Não é só porque o Campeonato Paulista está evoluindo em premiações, que a modalidade está evoluindo, que as coisas estão 100% boas, o Brasil quer sediar uma Copa do Mundo de Futebol Feminino nessas condições? O que fizemos foi uma forma de alertar as pessoas que acompanham a modalidade.”

As jogadoras ainda não receberam retorno do clube sobre como poderão voltar pras suas casas (muitas são de fora de Rondônia e moram em outros estados) – elas foram contratadas para jogar a Série A1 e, com o término da primeira fase (a equipe acabou rebaixada), tinham a promessa de que receberiam a passagem de volta para suas cidades.

Procurado pela reportagem para se posicionar sobre as denúncias das atletas, o Real Ariquemes ainda não se manifestou. O presidente do clube, Chico Pinheiro, que também é vereador em Rondônia, não atendeu as ligações, mas respondeu por mensagem ainda na segunda-feira que “estava na sessão da Câmara de Vereadores” e que o clube se pronunciaria nesta terça-feira (13/6). Até o momento da publicação, isso não aconteceu.

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