Foto: Reprodução/ RPC
Após estrear no comando do Athletico Paranaense no último domingo (10), Cuca leu um pronunciamento em que mudou de postura sobre a condenação que sofreu por estupro contra uma menina de 13 anos na Suíça, em 1987 – o julgamento (e consequentemente a sentença) foi anulado pelo Tribunal Regional de Berna-Mittelland no começo deste ano.
“Eu escolhi me recolher durante muito tempo, mas consegui seguir a minha vida, enquanto uma mulher que passa por qualquer tipo de violência não consegue seguir a vida dela sem permanecer machucada, carrega o impacto para sempre. Eu consegui seguir minha vida. O mundo do futebol e o mundo dos homens nunca tinha me cobrado nada, mas o mundo está mudando e eu acho que é para melhor”, disse o treinador.
A mudança de postura do Cuca é, sim, muito importante. Mesmo vindo com bastante atraso, seja pelas décadas que se passaram desde o ocorrido, seja pelos meses desde que o caso ganhou maior repercussão durante a passagem dele pelo Corinthians em 2023. Ainda assim, é um primeiro passo para que homens e a comunidade do futebol comecem a se enxergar como parte do problema – e da solução.
+ As mulheres derrubaram o treinador condenado. Os homens o abraçaram.
Mas o discurso lido por Cuca precisa ser visto sob uma perspectiva mais sólida. É, de fato, raro ver um personagem do futebol reconhecendo um problema tão grave quanto a violência de gênero e as consequências dela para as mulheres. Talvez seja inédito, até. Mas o uso da palavra “histórica” para definir a atitude de Cuca já soa como exagero.
Histórica, sim, foi a luta das mulheres para que um treinador reconhecido do futebol mudasse de postura diante de algo tão grave. Em quase 40 anos desde o ocorrido na Suíça, essa é a primeira declaração em que Cuca fala sobre a insegurança vivida pelas mulheres, sobre o preconceito em que o futebol está inserido e sobre ser educado e educar outros homens, principalmente os jovens que amam futebol, para combater a violência contra mulheres.
O Cuca falar abertamente sobre um episódio que ele já deveria ter encarado não é histórico. É quase uma obrigação moral. Acho um discurso importante, necessário. Óbvio. Mas veio com bastante atraso.
— Bruno Formiga (@brunoformiga) March 11, 2024
Essa mudança de posicionamento do treinador só ocorreu devido aos protestos e à repercussão liderada por mulheres – e que também só foi possível porque, hoje, elas estão mais presentes nos meios de comunicação, nos esportes, na Justiça e em outras instancias da sociedade. Nesse intervalo de tempo até que as mulheres começassem a ser ouvidas, porém, foram elas próprias que tiveram que reviver um tema tão dolorido.
Fomos nós que tivemos que repetir que violência contra mulher é, sim, muito grave. E fomos nós também que voltamos a ser alvos de xingamentos, ameaças e tantas outras formas de violência.
A Ana Thais Matos, comentarista do Grupo Globo, falou muito bem sobre qual é o real significado do discurso lido pelo Cuca: “Nunca mais uma mulher sofrerá violência no esporte e a vida de um agressor seguirá normalmente. Nunca mais. E essa é a verdadeira e única revolução!”