Brasil pode ter promessas da base na Copa: quais jovens já brilharam em mundiais?

Aline Gomes

(Foto: Adriano Fontes/CBF)

A atacante Aline Gomes estreou na seleção principal contra a Alemanha, na semana passada, aos 17 anos e 9 meses. Revelada pela Ferroviária e um dos destaques do Brasil no Mundial sub-17 e sub-20 de 2022, essa promissora jogadora convenceu a técnica Pia Sundhage a convocá-la para a última Data-Fifa antes da Copa do Mundo da Austrália e Nova Zelândia, que também incluiu a Finalíssima contra a Inglaterra, no início de abril. A questão é: essa aposta para o futuro da seleção brasileira vale uma vaga no Mundial?

No ano passado, Ronaldo Fenômeno defendeu a convocação de Endrick, atacante de apenas 16 anos do Palmeiras, para a Copa do Mundo masculina do Catar. Ronaldo declarou que sentia falta desse tipo de convocação na seleção, assim como aconteceu com ele próprio em 1994, que foi levado por Parreira para o Mundial com 17 anos; e com Kaká, que foi ao Mundial de 2002 com 20 anos, quatro meses após estrear na seleção principal.

O trio mais famoso da seleção brasileira feminina também ganhou chance de acumular experiência desde cedo. Marta estreou pela seleção com 16 anos, em 2002, e foi levada para a Copa do Mundo no ano seguinte. Cristiane foi convocada para representar o Brasil com apenas 15 anos, em 2001, e aos 19 disputou a primeira Olimpíada, em Atenas-2004. Formiga fez o debute com a amarelinha aos 17, em 1995, e no ano seguinte marcou presença nos Jogos Olímpicos de Atlanta-1996, o primeiro do futebol feminino no evento.

Para Pia, isso não seria bem uma novidade, já que a sueca levou a atacante Giovana Queiroz com 18 anos aos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2021. E olha que a treinadora nem havia intensificado a renovação da seleção, conforme fez após as Olimpíadas. Hoje, Ary Borges e Kerolin são peças fundamentais do meio-campo brasileiro aos 23 anos. Duda Sampaio, de 21, é outra meia que pode pintar no Mundial, assim como a atacante Nycole Raysla, de 23. A lista de “novinhas” do Brasil pode contar ainda com a lateral Bruninha, 21; a zagueira Lauren, 20; e talvez a zagueira Tarciane, 20.

Na Copa do Mundo de 2019, Geyse foi a caçula da seleção brasileira, com 21 anos. Hoje, aos 25, a atacante do Barcelona é peça fundamental desse jovem elenco que a Pia pretende levar para o Mundial. Mas há quatro anos, o debate sobre abrir espaço a jovens promissoras esquentou mesmo na seleção francesa, que foi para a Copa sediada no próprio país sem a prodígio Marie-Antoinette Katoto, com 20 anos na ocasião.

A então técnica da seleção Corinne Diacre deixou de fora simplesmente a artilheira do Campeonato Francês pelo Paris Saint Germain. Diacre comentou que “foi uma escolha difícil e que a jovem tem enorme potencial, mas faltou algo nela que nas outras não faltou. Eu privilegiei o grupo”. A França caiu nas quartas de final do Mundial para os Estados Unidos. Já Diacre caiu do comando da seleção quatro meses antes do Mundial deste ano após um grupo de jogadoras se recusarem a defender a equipe em protesto a gestão dela. Katoto estava entre elas, ao lado de Wendie Renard e Kadidiatou Diani.

Polêmicas à parte, a treinadora Martina Voss-Tecklenburg foi no sentido contrário ao relacionar Lena Sophie Oberdorf com apenas 17 anos e 166 dias para a Copa de 2019: ela foi a caçula da Alemanha no Mundial. Atualmente, no auge dos seus 21 anos, a volante é uma das melhores jogadoras do cenário internacional no setor onde atua. Destaque do clube alemão Wolfsburg, que está nas semifinais da Champions League, Oberdorf é também um dos pilares do forte meio campo dessa seleção alemã que foi vice-campeã da Eurocopa em 2022 e é uma das favoritas para o Mundial deste ano.

Em 2019, Giulia Gwinn foi outra jovem promessa alemã levada pela técnica Voss-Tecklenburg para a Copa. Ela vestiu a camisa da seleção principal pela primeira vez aos 19 anos e dois meses depois, quando tinha completado 20 anos, estreou no Mundial marcando o gol da vitória da Alemanha sobre a China, por 1 a 0, na fase de grupo. Gwinn terminou eleita como melhor daquela partida e ainda levou o prêmio de Melhor Jogadora Jovem do torneio.

Mas a atleta mais jovem da última Copa foi a australiana Mary Fowler, com 16 anos e 109 dias. Apesar de não ter entrado em campo, ela comemorou “a experiência enorme para aprender”. Fowler estreou na seleção com 15 anos, contra o Brasil no Torneio das Nações de 2018. Desde então, esteve também nas Olimpíadas de Tóquio e na Copa Asiática de 2022. Aos 20, ela atua tanto no meio-campo quanto no ataque e acumula 9 gols em 36 jogos pela seleção australiana. Fowler se destacou no futebol francês com o Montpellier antes de chegar ao Manchester City na atual temporada, em que marcou 4 gols e deu 2 assistências em 20 jogos.

Fifa passa a premiar jovens

Desde 2006, a Fifa passou a entregar o prêmio de Melhor Jogador Jovem ao atleta destaque da Copa do Mundo masculina com menos de 21 anos (no início do ano de disputa da Copa), premiação que chegou ao futebol feminino pela primeira vez em 2011. E não é que lá estava outra jovem promessa australiana! Caitlin Foord ganhou o prêmio aos 16 anos pela atuação na Copa disputada na Alemanha. E olha que durante o torneio, a Austrália enfrentou o Brasil e coube à ela a missão de anular Marta!

“Aquela Copa me abriu os olhos. Não sabia bem o que era uma Copa do Mundo até que eu estava lá, jogando. Ainda me lembro de ir para aquele primeiro jogo contra o Brasil, com milhares de pessoas ali, de ver jogadoras como a Marta e os maiores nomes do futebol naquele tempo. Eu me lembro de pensar: ‘Isso é demais, quero viver isso o máximo que puder'”, contou a jogadora, em entrevista à Fifa. Hoje, a jogadora que ganhou maior destaque no ataque acumula 18 gols em 55 jogos pela seleção australiana e é jogadora do Arsenal desde 2019. Na atual temporada, ela soma 10 gols e 9 assistências em 30 jogos pelo Arsenal.

Australiana Caitlin Foord teve a missão de marcar Marta na Copa do Mundo de 2011 | Foto: Getty Images

Naquela mesma Copa do Mundo, o principal nome do futebol australiano estreava na competição. Sam Kerr jogou o Mundial de 2011 com 17 anos. A atacante chegou à seleção principal com apenas 15 anos. Atualmente, é a maior artilheira de todos os tempos da Austrália, com mais de 50 gols, superando Tim Cahill. Desde 2020, a artilheira nata defende as cores do Chelsea, clube pelo qual conquistou duas Copas da Inglaterra e duas Copas Continentais, além de ganhar o prêmio da Chuteira de Ouro pela artilharia na temporada 2021/2022. Neste ano, Kerr foi a primeira mulher a estampar as capas do vídeo-game Fifa 23 (ao lado de Mbappé) e se prepara para disputar o quarto mundial da carreira em seu país.

Na Copa do Mundo de 2015,  a canadense Kadeisha Buchanan, com então 19 anos, levou o prêmio de melhor jogadora jovem da competição, disputada no próprio país. E as conquistas não pararam por aí. Buchanan  integrou a equipe canadense que foi campeã olímpica nos Jogos de Tóquio, em 2021, e da equipe que venceu o Brasil na disputa de terceiro lugar nas Olimpíadas do Rio, em 2016, garantindo também uma medalha de bronze.  Depois de atuar seis temporadas pelo Lyon, hoje ela é zagueira do Chelsea.

Canadense Kadeisha Buchanan levou o prêmio de Melhor Jogadora Jovem no Mundial de 2015 | Foto: Getty Images)
Melhores do mundo que começaram cedo

Assim como Marta, outras duas estrelas do futebol internacional que começaram suas trajetórias em Copas do Mundo antes de atingir a maioridade depois chegaram ao ápice da carreira, com o reconhecimento da Fifa pelo prêmio de melhor do mundo. Nome gigante do futebol alemão, a centroavante Birgit Prinz  estreou na seleção principal com 16 anos, em 1994, e disputou o primeiro Mundial dela em 1995, aos 17 anos.

Quase uma década depois, Prinz liderou a Alemanha na conquista do bicampeonato mundial, em 2003 e 2007. Ela marcou o primeiro gol da vitória da Alemanha sobre o Brasil, por 2 a 0, na final da Copa de 2007. A atacante alemã foi eleita em 2003, 2004 e 2005 a melhor jogadora do mundo pela FIFA e também conquistou três medalhas olímpicas (bronze em 2000, 2004 e 2008).

Na mesma Copa de 1995 disputada na Suécia em que Prinz estreou pela Alemanha, a meia Homare Sawa debutou na competição pela seleção japonesa, também aos 17 anos. Mas foi só em 2011 que ela gravou o nome na história do futebol japonês. Naquele ano, o Japão conquistou o primeiro título em Copas do Mundo e a jogadora, com então 33 anos, foi eleita a melhor da competição. No ano seguinte, Sawa conquistou a Bola de Ouro de Melhor Jogadora do Mundo pela FIFA, superando Marta e a estadunidense Abby Wambach.

Marta, Birgit Prinz e Cristiane com Chuteiras de Outo, Prata e Bronze, respectivamente, após Copa do Mundo 2007 | Foto: Getty Images

 

Categorias de base “amadurecem” jogadoras

Tanto a japonesa Homare Sawa, quanto a alemã Birgit Prinz fazem parte de um grupo seleto de craques que, desde cedo, mostraram ser muito acima da curva. São apostas nesse tipo de jovens promissores que Ronaldo declarou sentir falta na seleção brasileira das últimas décadas. O ex-atacante deu o exemplo de Neymar, que poderia ter sido levado à Copa de 2010 por Dunga para chegar com mais bagagem na edição de 2014 em que era a estrela do Brasil. A diferença é que Neymar (assim como o próprio Ronaldo, Kaká e Endrick) passou por todas as etapas de formação de um jogador.

Já os casos de Sawa e Prinz se assemelham ao de Marta, que tinha apenas 14 anos quando já fazia parte do time adulto do Vasco de 1999, que também tinha no elenco Sissi, Pretinha e Roseli, titulares da seleção brasileira na época. Aos 17 anos, Marta até chegou a passar pela seleção brasileira sub-19, recém-criada pela CBF para disputar o primeiro Campeonato Mundial Feminino Fifa Sub-19, realizado em 2002, no Canadá. O torneio contou com Cristiane e Daniela Alves e a canadense Christine Sinclair. Enquanto treinava para o Mundial de base, Marta acabou convocada também para a seleção adulta. 

A partir de 2006, na edição sediada na Rússia, o limite de idade do Mundial Feminino de base subiu para 20 anos. E só em 2008 a  Copa do Mundo de Futebol Sub-17 começou a ser disputada no futebol feminino. Até então, a falta de categorias de base em boa parte dos países fez com que muitas jogadoras saltassem etapas da formação e, em muitos casos, chegassem à seleção principal “cruas” para o nível de exigência de competições internacionais adultas. É ainda mais recente a realização de ligas de desenvolvimento de clubes dentro dos próprios países. 

No Brasil, apenas em 2019 a CBF implementou os Campeonatos Brasileiro Feminino Sub-16 e sub-18 (que desde 2022 viraram sub-17 e sub-20). Esta será a primeira Copa do Mundo feminina que o Brasil contará com atletas que disputaram o Brasileiro de base durante a fase de formação.

A lateral Bruninha tinha 17 anos quando jogou a primeira edição do torneio sub-18, pelo Internacional, em 2019, e depois disputou o Brasileiro sub-20 pelo Santos. A zagueira Lauren, que foi titular na Finalíssima contra a Inglaterra, é outro exemplo de jogadora que teve a oportunidade de competir no Brasileirão das categorias de base pelo São Paulo. São etapas de formação que fazem essas jogadoras chegarem muito mais “prontas” para lidar com o desafio de representar a seleção brasileira principal numa Copa do Mundo. 

Veja jogadoras que estrearam em grandes eventos jovens

Mary Fowler (Austrália) – 16 anos – Copa do Mundo de 2019

Caitlin Foord (Austrália) – 16 anos – Prêmio de melhor jogadora jovem da Copa de 2011

Marta (Brasil) – 17 anos – Copa do Mundo de 2003

Formiga (Brasil) – 17 anos – Copa do Mundo de 1995

Birgit Prinz (Alemanha) – 17 anos – Copa do Mundo de 1995

Homare Sawa (Japão) – 17 anos – Copa do Mundo de 1995

Sam Kerr (Austrália) – 17 anos – Copa do Mundo de 2011

Lena Sophie Oberdorf (Alemanha) – 17 anos – Copa do Mundo de 2019

Cristiane (Brasil) – 19 anos – Jogos Olímpicos de Atenas-2004

Kadeisha Buchanan (Canadá) – 19 anos – Prêmio de melhor jogadora jovem da Copa de 2015

Giulia Gwinn (Alemanha) – 20 anos – Prêmio de melhor jogadora jovem da Copa de 2019

Geyse (Brasil) – 21 anos – Copa do Mundo de 2019

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