Visando Paris-2024, Zé Roberto fala sobre reformulação do time: “pegaremos um período de transição”

Em live organizada pelo Time Brasil na última sexta-feira (18), Zé Roberto, tricampeão olímpico e técnico da seleção feminina de vôlei, comentou sobre mais um ciclo à frente da seleção e o que podemos esperar da próxima Olimpíada, que será realizada em 2024, em Paris.

Treinado a seleção feminina de vôlei desde 2003, Zé Roberto foi bicampeão olímpico (2008 e 2012) e, na última edição dos Jogos, em Tóquio, foi vice-campeão.

“É um ciclo curto. A Seleção Brasileira Feminina deve passar por alguma reformulação. Esse ano, por exemplo, a gente tem dois campeonatos muito importantes, o primeiro é a Liga das Nações e depois o Campeonato Mundial e qualquer planejamento que a gente fizer, estaremos pensando em Paris, que é o nosso objetivo principal. Várias jogadoras vão ser testadas”, declarou.

JÚLIO CÉSAR GUIMARÃES/COB
O vôlei feminino no Brasil

Zé Roberto também explicou um pouco sobre a dificuldade que o esporte vem passando no país. “Hoje, o vôlei feminino atravessa uma fase um pouco preocupante. Acho que a quantidade de jogadoras que a gente tem hoje no Brasil, não é suficiente. Nós tínhamos que ter mais time trabalhando a base, mais times produzindo jogadoras e isso não está acontecendo muito e, logicamente, a gente sofre com a quantidade, diferente dos Estados Unidos, com 364 universidades. Você tem alguns países que estão investindo muito na categoria de base, acho que o Brasil ficou um pouquinho na contramão, ou seja, tudo aquilo que nós fazíamos com a categoria de base, treinar cinco, seis meses durante um ano, pra disputar o campeonato, seja Sul-Americano ou Brasileiro, hoje a gente faz com três meses. Isso é um pouco de investimento, uma série de coisas que o voleibol brasileiro atravessou”, desabafou.

 

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“Muitas vezes eu questiono: qual é o seu objetivo na base? Formar jogadoras ou ganhar campeonatos? Eu acho que é a formação de jogadoras para a equipe adulta. ‘Ah, mas é bom ganhar na base’. É bom ganhar na base desde que você invista em jogadoras que serão importantes para o futuro. As jogadoras mais altas, elas são um pouco mais tardias, então tem que ter um pouco mais de paciência, um pouco mais de tempo de trabalho, mas estamos tentando, junto com a Federação, retomar esse trabalho de mais tempo de treinamento, de mais jogos, que também foram reduzidos, amistosos antes de campeonatos, ir para outros países e ficar treinando com as outras seleções. Tudo isso tem que ser retomado para que a gente também tenha mais tempo dessas jogadoras treinando e jogando”, frisou.

O planejamento

“Toda renovação é muito válida. A renovação depende das jogadoras que você tem, como você vai trabalhar e fazer essa transição. O meu planejamento sempre foi assim: ter quatro jogadoras mais velhas, com 28, 32, pra cima, ter quatro jogadoras de 24 a 28 anos e quatro jogadoras de 17 a 22 anos. Uma mescla e essa escadinha sempre foram fórmulas importantes para um time, porque vão saindo as mais velhas, vão entrando as mais novas e você sempre vai tendo uma seleção que possa competir e jogar contra as melhores seleções do mundo. Mas nem sempre isso é possível, depende muito se as jogadoras são longevas. Hoje, por exemplo, aumentou muito isso na vida útil de uma jogadora. Antigamente as jogadoras jogavam até 32, 34 anos e começavam a pensar na família, em ser mãe. Hoje não, tem jogadoras atuando com 38, 39, 40, 44 anos, e jogando bem. Então, a idade também não é o limitante. Eu acho que o importante é elas terem experiências, antes dos Jogos Olímpicos, essas experiências vão ser nesses campeonatos que vamos disputar seja Liga das Nações, seja o Campeonato Mundial, elas precisam passar por essas dificuldades pra poderem serem preparadas para 2024. Vai ser uma exigência muito grande, a gente tem ainda que classificar, a gente vai pegar um período de transição das jogadoras”, relembrou.

 

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O técnico dá alguns exemplos de jogadoras que poderiam seguir na seleção, mas priorizaram a sua vida pessoal. “A Fernanda Garay, que é uma jogadora excepcional, eu gostaria muito que continuasse. Ela tem lenha pra queimar ainda, mas me disse: ‘olha, eu quero cuidar da minha família’. A Camila Brait, quer cuidar da família. Todas são importantes, mas as jogadoras têm objetivos, prioridades, e a gente tem que respeitar e se adequar ao tempo, ao momento, e a gente sempre quer ter as melhores jogando, sempre quer vencer”, reforçou.

 

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Ciclo de Tóquio

Nas Olimpíadas de Tóquio, o vôlei feminino chegou muito próximo de levar o seu terceiro ouro olímpico – o primeiro foi em Pequim 2008 e o segundo em Londres 2012, mas, infelizmente, a seleção perdeu a final contra os Estados Unidos. As americanas superaram as brasileiras por três sets a 0.

Na live, Zé Roberto contou um pouco como foram os bastidores deste ciclo olímpico. “A gente teve um ciclo de Tóquio um pouco tumultuado em relação a pedidos de dispensa, algumas jogadoras com depressão, cobranças, problemas particulares, uma série de coisas, e isso implicou em uma mudança bastante grande. Vou dar alguns exemplos: eu esperava contar com a Thaisa que tinha feito uma Superliga excepcional, mas no último momento, a Thaisa, pra preservar o físico, o joelho e pra ter uma longevidade na modalidade, preferiu não ir pra seleção. A Fabiana, que engravidou, foram duas jogadoras que, no planejamento, estavam dentro, e a gente teve que abrir mão. Então, mudanças tiveram que acontecer, são coisas inesperadas que você pensa: ‘Tá bom, a gente vai perder bastante sem elas, pela experiência, pelo respeito que as adversárias tem por elas e, consequentemente, pelo time do Brasil’”, contou.

 

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Mas o treinador de 67 anos realça o orgulho que sentiu de suas jogadoras. “Eu acho que a gente fez uma Olimpíada brilhante. Nós tivemos problemas sim, a nossa derrota, para os Estados Unidos na final, tivemos aquele episódio da Tandara (que retornou ao Brasil por violar a regra antidopagem). A Tandara sempre foi uma jogadora importante e de decisão. Nas Olimpíadas que você tem que torcer para os deuses olímpicos conspirarem ao seu favor, junto com a preparação, treinamento, é um contexto que, lá em cima, diz: ‘mereceu ou não mereceu’”, declarou.

“Todos querem ganhar, você vê a Itália, que tem um bom time, nunca foi campeã olímpica, a Sérvia que tem um bom time, nunca foi campeã olímpica. O maior exemplo pra mim foi a China. A China foi campeã olímpica em 2016, no Rio de Janeiro, e 9ª colocada em Tóquio. Se a gente é 9ª colocada, eu tenho que mudar de país, as jogadoras precisam mudar de país. São coisas que acontecem na trajetória de um time. Eu sempre digo ‘depois de uma grande conquista: cuidado.’ Sempre pode ter problemas. Todo mundo quer ganhar de um campeão olímpico, é um time a ser batido. Campeão olímpico é o maior título que um atleta pode ter, mais do que o mundial”, finalizou Zé Roberto.

 

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Nos dias 19 e 20 de março acontecerá o II Congresso Olímpico Brasileiro, organizado pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB), em Salvador. Neste evento, haverá uma mesa-redonda para debater o papel da mulher no esporte e Zé, que comandou a seleção masculina de vôlei por quatro anos e está há 18 à frente da seleção feminina, falou um pouco sobre o tema.

“As mulheres me ensinaram muito mais do que trabalhando com os homens. Eu acho que essa busca por estudar o organismo feminino, o que acontece com o metabolismo feminino, eu sempre falo que talvez eu seja o único técnico que se consulta com o ginecologista. Eu preciso da ajuda de um ginecologista, elas precisam se consultar, porque essa parte metabólica é muito importante da performance da atleta, então, saber qual é a tríade de uma mulher atleta, as situações que elas passam, são coisas que precisam ficar muito atentas. Eu comecei a entender que eu tinha que ir atrás de alguma coisa a mais, não só entrar na quadra e dar treinos, ‘como é que é o sintoma de tpm?’, ‘quais são esses sintomas?’, ‘como é que eu, como profissional, vou me comportar quando isso acontecer?’ Eu acho que esse entendimento, técnico e jogadora, comissão técnica e jogadoras, é muito importante nesse contexto, em busca de uma performance melhor”, destaca. 

 

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A importância da Seleção Brasileira feminina de vôlei

O técnico encerrou o papo falando sobre as escolhas que é necessário fazer para alcançar o seu objetivo dentro da seleção. “Não é só estatura, é o amor pela seleção nacional, é a paixão, o orgulho de vestir essa camisa, querer estar. Porque para jogar na seleção você tem que estar seis, cinco meses disponível, viajando pelo mundo, muitas vezes afastadas dos seus amigos, do seu filho, filha, se dedicando. Primeira coisa, pra mim, é o orgulho de vestir essa camisa, depois é toda a preparação e o foco que ela vai ter nessa dedicação pra estar entre as doze jogadoras que jogam os Jogos Olímpicos. Eu queria levar todo mundo, a pior parte pra mim é a hora do corte, é muito difícil, mas isso tem que acontecer”, finalizou. 

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Uma resposta

  1. A renovação não deve ser pensada só em jogadoras. É importante começar a pensar na renovação de treinadores e comissão técnica também, Zé não vai ficar a vida inteira e o trabalho que eles fazem são essenciais para a trajetória da seleção.
    Parabéns pela reportagem, importante esse espaço para falar de vôlei. 🙂

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