Que “a Rebeca é baile de favela” todo mundo já sabe. Mas a ginasta que já conquistou duas medalhas olímpicas (prata no individual geral e ouro no salto sobre a mesa) nem precisava conquistar uma medalha por lá para se sentir vitoriosa. A simples presença de Rebeca no Japão já é motivo de grande comemoração – ainda mais considerando a luta que ela precisou travar para chegar até lá.
Aos 22 anos, é até difícil dizer se Rebeca chega a essa Olimpíada no seu ápice. Porque durante toda a preparação neste ciclo olímpico, ela precisou lidar com duas cirurgias difíceis no joelho, uma em 2017 e a outra em 2019. Antes disso, ainda em 2015, um ano antes da Rio-2016, Rebeca passou por sua primeira reconstrução de ligamento no joelho direito. Foram três operações “iguais” e três recuperações igualmente desafiadoras. Desistir passou pela cabeça. Mas a mãe dela, dona Rosa Santos, não deixou que isso acontecesse.
“Todas cirurgias foram no mesmo joelho, o direito, e no mesmo local. Se bem que desta última vez eu fiz uma no esquerdo, que foi para tirar um pedaço do tendão patelar para poder fazer um enxerto no joelho direito. Mas as lesões são todas no direito. A primeira em 2015, a segunda em 2017, a terceira em 2019”, contou Rebeca em entrevista ao Globoesporte em julho de 2020.
“É lógico que passa pela nossa cabeça a vontade de parar de treinar, que eu não vou conseguir voltar, e eu cheguei a falar isso para minha mãe: ‘eu não quero mais treinar, eu quero voltar para casa’. E ela disse: “não, a mãe não vai deixar você parar de treinar se você não tentar’. Se em 2015 eu tivesse parado, olha o tanto de coisa que eu teria perdido. O tanto de evolução como ser humano, não só como atleta, eu teria perdido”, avaliou.
Uma coisa é certa: se tivesse parado, Rebeca não teria conquistado duas medalhas olímpicas e não teria encantado o mundo com sua apresentação de solo ao som do funk Baile de Favela no Japão.
A menina que sempre teve como referência a ginasta Daiane dos Santos e que saiu de Guarulhos para disputar uma Olimpíada do outro lado do mundo precisou superar muitas adversidades na caminhada até lá.
Início
Rebeca tem seis irmãos e sempre foi muito agitada, desde pequena. A mãe, dona Rosa, era empregada doméstica e passava boa parte do dia fora. Então a tia decidiu levá-la ao ginásio perto da casa onde moravam em Guarulhos para que ela praticasse algum esporte. A menina iniciou na ginástica aos quatro anos e já demonstrou talento.
Ao longo do tempo, o irmão mais velho ficava responsável por levá-la aos treinos de bicicleta. Mas para que Rebeca pudesse se desenvolver plenamente no esporte, era preciso mais. Houve uma oportunidade de ela se mudar para Curitiba para morar com a coordenadora e os treinadores e intensificar os treinos em busca de se tornar uma atleta de verdade. A menina tinha nove anos, e a mãe apostou no sonho dela e permitiu que ela fosse.
“Eu saí com oito ou nove anos, a gente não tinha muitas condições, minha mãe não tinha como me levar sempre no ginásio. Então, quando era pequena, eu ia um dia treinar e faltava três. Eu não ia evoluir. Quando deram a oportunidade de eu morar com a coordenadora, com meus treinadores, ela me deixou ir. Isso abriu portas. Se ela tivesse impedido a filhinha, tão novinha, pequenininha, eu não estaria aqui hoje e não seria a Rebeca Andrade que tantas pessoas admiram”, contou ao Globoesporte.
Com 11 anos de idade, foi a vez de Rebeca ter a oportunidade de treinar no Flamengo, e mais uma mudança de cidade aconteceu. Dedicada aos treinos, ela teve sua primeira conquista expressiva: foi campeã do Troféu Brasil de Ginástica Artística aos 13 anos em 2012.
Promessa
Por seu talento em todos os aparelhos, Rebeca Andrade sempre foi considerada uma ginasta completa e muito promissora. Quando tinha 15 anos, seu nome já era muito repetido no mundo da ginástica brasileira, e todo mundo apontava para a menina como “a nova Daiane dos Santos”.
Daiane, por sinal, é a grande referência de Rebeca. Uma desbravadora da ginástica, que conquistou o mundo ao som de Brasileirinho no solo, foi a primeira atleta brasileira a conquistar um ouro em um campeonato mundial da modalidade. Ela tem nove ouros em etapas de Copa do Mundo, além das tantas outras medalhas que colecionou ao longo da carreira.
Só que Rebeca não conseguiu repetir o feito da “ídola” Daiane nesses torneios. Isso porque a sequência de lesões que teve no joelho em 2015, 2017 e 2019 a tirou dos Mundiais. Aliás, para esta Olimpíada de Tóquio, Rebeca tinha apenas uma chance de classificar, que era no Campeonato Pan-Americano disputado no Brasil em junho.
“Eu vi o quanto ela treinou, o quanto ela batalhou, o quanto ela lutou para voltar da cirurgia. Ela é a minha inspiração dentro do ginásio. Ela tem força, ela tem luz, ela tem garra… A gente trabalha muito, treina muito duro porque a gente quer mostrar que a gente é capaz. E ela mostrou muito isso. Ela tinha uma chance e aproveitou a única chance que ela tinha”, declarou Flávia Saraiva ao Olimpíada Todo Dia em julho, comentando sobre a resiliência que levou Rebeca aos Jogos de Tóquio.
“Isso quer dizer que sou muito guerreira e que tenho um sonho, um objetivo muito grande. Porque não é fácil passar por lesão, cirurgia e essas coisas. Você tem que amar muito, muito!”, disse Rebeca.
Três finais
Rebeca Andrade sempre teve como forte seu conjunto nos aparelhos. E, na classificatória, ela demonstrou isso com a soma de suas notas para o individual geral. Ficou apenas atrás de ninguém menos que Simone Biles. Na final, ela conquistou a medalha de prata.
“Meu forte sempre foi o individual geral. Eu acho que quando junta todas as minhas notas dá um resultado bom”, disse ela em uma entrevista no passado.
Ela já conquistou duas medalhas e ainda tem chance da terceira, na apresentação do solo nesta segunda-feira.
Depois de ter superado três cirurgias e de ter voltado da última justamente no início da pandemia – o que fez com que ela retardasse seu retornou aos treinamentos fortes e às competições, porque as atletas ficaram reclusas por alguns meses em casa -, Rebeca se sente forte e pronta para viver os “Jogos Olímpicos da sua vida” em Tóquio.
Pra quem perdeu, o momento em que Tóquio virou um grande BAILE DE FAVELA!
Quem não se arrepiar, já tá morto por dentro. QUE ESPETÁCULO, Rebeca Andrade
— dibradoras (@dibradoras) July 25, 2021
“A gente treina bastante para dar nosso melhor nos poucos segundos, minutos, que duram as nossas séries. Foi muito trabalho envolvido. Com essa coisa de pandemia ficou muito difícil porque ficamos muito tempo em casa. Então estar aqui é uma alegria enorme. Eu passei por isso (lesão) três vezes e me fez mais forte. A gente tem que usar como uma coisa boa, e não como algo pra nos deixar mais pra baixo. Eu to bem feliz porque consegui fazer boas apresentações”, disse à TV Globo após a classificatória.
A torcida é para que ela siga nos encantando com sua performance na ginástica. A primeira campeã olímpica da ginástica brasileira entre as mulheres é ela: Rebeca Andrade!
Uma resposta
Rebeca e Fantástica. Parabéns Garota. Deus te Abençoe Imensamente