(Foto: Thais Magalhães/CBF)
Depois de conhecer as 23 convocadas e 3 suplentes que a técnica Pia Sundhage anunciou na sede da CBF, na última terça-feira (27), a presença de dois nomes causou espanto em grande parte dos jornalistas e torcedores que cobrem e acompanham a Seleção Feminina de Futebol: a goleira Bárbara (que defende o Flamengo) e a zagueira Mônica (jogadora do Madri CFF). E o que as duas jogadoras têm em comum? Não foram convocadas pela treinadora sueca há uns bons anos.
Surpresos, os jornalistas questionaram a técnica sobre a escalação das duas jogadoras e ouviram que, após perdas por lesões (goleira Lorena e zagueira Taianara), a experiência de ambas foi o principal motivo que as trouxe de volta ao time às vésperas da competição mais esperada dos últimos quatro anos.
+ Pia surpreende com veteranas improváveis; seleção terá 11 estreantes na Copa
Ontem me perguntaram na programação sobre a Cristiane.
— Alline Calandrini (@allincalandrini) June 28, 2023
Vamos lá! Precisamos ter uma a análise mais embasada sobre o assunto e irmos um pouco além da palavra “renovação” (que hj perdeu a credibilidade) e claro, sob a ótica da treinadora.
É de se valorizar a experiência das atletas mais velhas, com vivências importantes dentro da Seleção, mas essas duas escolhas de Pia soaram um tanto quanto incoerentes, já que em outras situações, a treinadora não teve a mesma postura com outras jogadoras. Uma delas é Cristiane Rozeira, um dos maiores nomes do time brasileiro e que não faz parte dos planos da treinadora desde antes dos Jogos Olímpicos de Tóquio.
Questionada em julho de 2021, Pia declarou que o desempenho da atacante santista foi analisado e, juntamente com a comissão, optaram pela não convocação da atleta. É verdade que Cris sofreu com lesões após a Copa de 2019 e isso atrapalhou um pouco a presença dela na seleção sob o comando de Pia (que assumiu o cargo em julho de 2019).
+ Por que Cristiane não foi convocada para os Jogos Olímpicos de Tóquio
Defendendo o Santos desde 2020, é de se valorizar os números que a jogadora ostenta com a camisa do clube alvinegro: tem 91 jogos disputados e 58 gols marcados. Na temporada passada, ela atingiu a notável marca de 30 jogos e 32 gols marcados e neste ano, ela segue bem e é uma das referências do ataque santista: 20 jogos, 11 gols e três assistências. Se analisarmos o quesito experiência e desempenho, dentro de campo, Cristiane tem mostrado que merecia uma nova chance com a camisa da seleção, mas há dois anos ela não aparece entre as convocadas.
Pia foi questionada sobre a ausência da atacante no plantel formado para o Mundial e, mais uma vez, se esquivou do assunto e respondeu sem maiores explicações. “Para mostrar respeito às 26 jogadoras que nós estamos levando, nós deveríamos falar dessas jogadoras que estamos levando, não de quem não foi convocada“, disse a treinadora.
Cristiane é a segunda maior artilheira da história da seleção com 96 gols atrás apenas da recordista Marta, com 122.
Mônica apareceu trajada antes mesmo da convocação
Quando a CBF anunciou que, pela primeira vez, o time feminino teria um traje exclusivo de viagem e, na foto de divulgação do uniforme, a zagueira Mônica apareceu uniformizada entre as atletas que atuam na Seleção Brasileira, muita gente se espantou. Mas, além de marcar presença nas fotos oficiais do novo uniforme, Mônica também esteve na Granja Comary e treinou com as jogadoras que atuam na Europa antes da convocação para a Copa do Mundo acontecer.
A presença de Mônica causou estranheza porque a atleta de 36 anos (que joga no Madri CFF desde 2019) não fazia parte dos planos da técnica Pia Sundhage na seleção desde novembro de 2019. Mônica é titular no time espanhol e, na última temporada, atuou em 27 jogos e conta com 2 gols e uma assistência.
“Não tivemos muita sorte com a Tainara (zagueira) que se machucou e ela não estava jogando desde abril. Então, para substituí-la, precisávamos de experiência e a Mônica estava jogando toda semana (com o clube) e também é uma excelente líder. Acho que ela vai ajudar nossa equipe com sua presença e experiência”, declarou Pia durante a coletiva de imprensa de convocação.
A surpresa com a escalação de Mônica se deve pelo longo tempo de ausência da atleta no time brasileiro. Apesar de experiente e de estar bem fisicamente, a jogadora não atuou com nenhuma das zagueiras do time nos últimos anos (Rafaelle, Kathellen e Lauren). E, mesmo sem ter a titularidade garantida no time para a Copa, Mônica foi convocada para disputar o torneio mais importante da modalidade sem ter defendido o Brasil por mais de três anos.
Contestada, Bárbara também volta à Seleção
Não dá pra negar que a arqueira de 34 anos tem vasta experiência com a camisa do Brasil: disputou quatro Copas do Mundo e quatro edições de Jogos Olímpicos. Além disso, fez parte das convocações de Pia Sundhage até Tóquio-2021 e foi titular da equipe até as quartas de final da competição, quando o Canadá eliminou o Brasil na disputa de pênaltis.
Após esse ciclo, Pia começou um processo importante de renovação dentro da equipe brasileira e novas goleiras foram testadas, como Lorena (Grêmio) e Natascha (que defendeu o Corinthians por dois anos). Luciana (goleira da Ferroviária) já é mais experiente, tem 35 anos, disputou a Copa de 2015 como titular e chegou a ser convocada 9 vezes pela técnica – a mais recente delas aconteceu nos amistosos de abril, contra Inglaterra e Alemanha.
Opinião resumida sobre a convocação de ontem: a escolha por Mônica dá pra discordar, mas deu pra entender o critério.
— Renata Mendonça (@renata_mendonca) June 28, 2023
A escolha da goleira experiente não dá pra entender. Porque a Luciana entrava nesse critério. E, nesse caso, não foi justo com ela o processo.
A convocação de Bárbara chegou a ser mais chocante do que a de Mônica porque, além de não fazer parte dos planos de Pia há quase dois anos (não foi convocada desde a Olimpíada), a goleira não vive boa fase no Flamengo, falhando em algumas situações (atuou em 20 jogos e sofreu 24 gols).
A goleira titular do Brasil na Copa será Letícia (do Corinthians) e a jovem Camila (do Santos) também ganhou mais uma oportunidade. Bárbara será a 3ª opção de goleira no Mundial e, com isso, Luciana – outra atleta experiente do time, que fez parte do ciclo preparatório e é peça fundamental no time que defende -, perdeu seu lugar para a veterana.
Durante coletiva de imprensa, a técnica da Ferroviária, Jéssica de Lima, falou sobre a ausência de Luciana na lista final de Pia. “Quem vai ter que resgatar a atleta somos nós agora. Se eu estivesse no lugar dela (Luciana), eu estaria inconformada, acho até que ela é muito mais serena do que eu. Vejo o mundo com meu olho, com minhas perspectivas e meus valores, não posso cobrar isso dos outros treinadores. A partir do momento em que você convoca todas as convocações, não tem como a atleta não ter expectativa. É chocante pra mim, não me recordo de ter visto isso em outras ocasiões, não estou desmerecendo quem foi como goleira, mas a maneira como as coisas se deram. Vou conversar com ela no treino pra entender se ela tá bem, se tem condições de atuar, o clube tá aqui para apoiá-la. A gente tem que respeitar a história dela e o ser humano que ela é.”
Jéssica de Lima, treinadora das @guerreirasgrena, falou sobre a ausência da goleira Luciana na lista das jogadoras convocadas pela técnica Pia Sundhage para defender a @SelecaoFeminina na @FIFAWWC. 👇🏽
— Dibradoras (@dibradoras) June 28, 2023
"Quem vai ter que resgatar a atleta somos nós agora". pic.twitter.com/rYTKZQJaWm
Lista final é forte, mas Pia foi incoerente
Pia Sundhage comandou a Seleção Brasileira em 53 jogos com 32 vitórias, 12 empates e 9 derrotas. Em 2023, foram cinco jogos disputados contra equipes top 10 do ranking e o Brasil venceu o Japão (1×0) e a Alemanha (2×1). As derrotas vieram diante do Canadá (2×0), Estados Unidos (2×1) e para a Inglaterra nos pênaltis, após empate em 1×1 no tempo regulamentar.
Nesse ciclo pós-Tóquio, Pia testou variações táticas e novas atletas. O repertório desse time é mais amplo, com jogadoras versáteis e com mais rodagem – seja com a camisa da seleção e de seus clubes. Mas é inegável que o ressurgimento de Bárbara e Mônica no time deixou grande parte das pessoas surpresas e com um grande ponto de interrogação na cabeça.
Quando achávamos que o assunto Cristiane na seleção estava superado, Pia tomou decisões que a fizeram cair em contradição e acendeu mais dúvidas sobre a não convocação da atacante santista. Falta de performance não é – e os números mostram isso. Se a experiência conta e o momento atual também, tem jogadora entregando um desempenho muito melhor e deixada de lado por questões que não ficaram esclarecidas.
Talvez o perfil ou temperamento de Cris não agrade a treinadora? Pode ser uma hipótese. E, já pensando em evitar conflitos nas redes sociais (como aconteceu durante os Jogos Olímpicos de Tóquio), a goleira Bárbara anunciou que estará afastada de seus perfis virtuais nos próximos dias.
Agora, com a lista fechada e a poucos dias da Copa, só nos resta apoiar o Brasil.