Aconteça o que acontecer na pré-Libertadores, Jardine precisa ser mantido

Foto: Divulgação sãopaulofc.net

Na última semana, estive no Pacaembu para São Paulo 0 x 1 Guarani e pude sentir de perto que a paciência dos torcedores são-paulinos com André Jardine já está perto do fim – ainda que ele tenha tido apenas um mês efetivo de trabalho. Não era difícil prever que isso aconteceria, assim como a previsão mais óbvia do futuro é a demissão do treinador possivelmente antes mesmo do início do Campeonato Brasileiro. E olha que não sou nenhuma mãe Dináh, isso é apenas uma observação embasada no comportamento da diretoria tricolor nos últimos anos.

De 2012, quando o São Paulo conquistou seu último título, para cá, foram 14 técnicos que passaram pelo clube do Morumbi, média de 2 por ano (foram eles: Emerson Leão, Milton Cruz, Ney Franco, Paulo Autuori, Muricy Ramalho, Juan Carlos Osorio, Doriva, Edgardo Bauza, Ricardo Gomes, Pintado, Rogério Ceni, Dorival Junior, Diego Aguirre, André Jardine) e 19 trocas considerando os períodos em que auxiliares assumiram na transição de um treinador para outro. Além de nenhum troféu levantado nesse período, é preciso lembrar que das cinco últimas edições do Brasileiro, o São Paulo flertou com o rebaixamento em três: 2013, 2016 e 2017.

Por conta de todo esse histórico, Jardine não era “o cara” para assumir o clube num ano sob tamanha pressão. Mas, ao mesmo tempo, Jardine tem grande potencial para ser “o cara” que pode retomar os períodos de glória do São Paulo se tiver o tempo e o apoio necessário para isso.

Para mim, o primeiro erro do planejamento do time do Morumbi para 2019 aconteceu em 2018, com a demissão de Diego Aguirre a cinco rodadas do fim do Brasileiro. Mas um erro não justifica o outro, e tirar Jardine com menos de dois meses de trabalho por uma eventual não classificação para a fase de grupos da Libertadores – ou mesmo por um eventual fracasso no Paulista – é um erro crasso que pode custar mais alguns anos de jejum ao time.

Vamos por partes. Eu não acho que Diego Aguirre seria o melhor treinador para o São Paulo em 2019. Mas acho que o uruguaio merecia ter terminado a temporada no comando do clube que ele próprio resgatou do limbo e o transformou em líder do Brasileiro por 8 rodadas. É claro que já não estava mais jogando bem na reta final e Aguirre não estava conseguindo tirar o melhor de seus jogadores, mas será que uma demissão faltando CINCO jogos para o fim do campeonato poderia resolver alguma coisa?

Não resolveu, e o São Paulo fracassou ao não conseguir a vaga direta para a Libertadores, que daria ao clube um respiro maior para poder apostar em Jardine para 2019 sem que ele tivesse de começar tão pressionado já com o “jogo do ano” para fazer praticamente no primeiro mês de trabalho.

Foto: Divulgação

Assim, o São Paulo começou o ano mega pressionado. Primeiro porque tem o jogo divisor de águas da temporada acontecendo já nesta quarta-feira. Segundo porque também não pode vacilar no Paulista, torneio que não vence desde 2005, quando ainda era disputado nos pontos corridos. E terceiro porque a torcida já não têm mais paciência para time meia-boca.

Na última década, o São Paulo passou por seus piores momentos, ameaças seguidas de rebaixamento, virou presa fácil nos clássicos e viu seus maiores rivais (Corinthians, Palmeiras e Santos) conquistarem títulos como Libertadores e Brasileiro, enquanto os tricolores ganharam apenas a Copa Sul-Americana em 2012. Por tudo isso, é difícil dizer que Jardine era o homem certo para estar à frente do time AGORA. Eu sou muito fã de suas ideias e de sua filosofia de jogo, mas nessas horas em que a pressão aumenta de todos os lados, é sempre melhor ter alguém experiente e “com moral” com a torcida para conseguir segurar.

Mas já que o São Paulo decidiu apostar no potencial de Jardine – que é inegável, considerando seus bons trabalhos nas bases de Grêmio, Inter e do clube do Morumbi -, é importante dar tempo para que ele amadureça e dê frutos. Demiti-lo por conta de uma derrota ou uma eliminação é seguir apostando na receita que levou o Tricolor ao limbo nos últimos anos.

A aposta em Jardine me agrada muito porque ele poderia estabelecer uma filosofia de jogo implementada em todas as categorias do São Paulo. O técnico vice-campeão com a base na Copinha de 2018 e campeão da Libertadores sub-20 com o São Paulo gosta de um jogo ofensivo, de toque de bola e pressão no campo adversário, de variações táticas e transições. O estilo de Jardine resgata aquele famoso “futebol bonito”, que dá gosto de ver em campo – como era com o time da base tricolor comandado por ele. Só que, para implantar tudo isso, leva tempo. Seria muito mais fácil para Jardine, pressionado pelo passado que condena o São Paulo na última década, “fechar a casinha”, montar um jogo defensivo, de contra-ataque (como era no ano passado), algo que seria mais simples de ser aplicado e absorvido pelos jogadores. Mas, hoje, com esse elenco no Morumbi, dá para fazer bem melhor. E por que não tentar?

Foto: Agif

Com Jardine, que veio da base, o São Paulo aproveita muito mais os promissores garotos de Cotia. Helinho é um entre os titulares, que ainda precisa ser lapidado; Liziero é essencial para o sistema de jogo do treinador; Antony pode ajudar muito atuando pela ponta direita; Luan é outro que já teve excelentes atuações como volante titular; e muitos outros do elenco campeão da Copinha neste ano podem ser aproveitados. Jardine seria o elo perfeito entre a base e o profissional, um cara que sabe promover os jogadores sem queimar o período de transição deles. Seria a forma ideal de o clube do Morumbi colher os frutos no time principal de todo o investimento que faz na base – e também lucrar com eles em posteriores vendas.

Ou seja, dando tempo a Jardine, acredito que o São Paulo poderia recriar seu DNA ofensivo e aplicá-lo em todas as categorias, garantindo uma integração entre profissional e base que é rara de se ver no futebol brasileiro.

É claro que tudo isso são suposições. Mas que têm um certo embasamento nos fatos. Muitos torcedores podem pensar que uma eventual eliminação para o Talleres representaria o fim de todo o planejamento do ano e que manter Jardine depois disso seria uma grande burrice. Tirar o treinador nessas situações é sempre a solução – aquela “mais fácil”, ao meu ver. Mas o que isso poderia mudar no real problema do São Paulo (o jejum de títulos e a crise de identidade)? Um novo técnico é garantia de sucesso ainda esse ano, como o torcedor quer imaginar? Acho difícil. Por isso, para mim é crucial que o São Paulo mantenha o planejamento e o técnico, na esperança de finalmente conseguir construir algo diferente dos últimos anos. Trocar o treinador após uma eliminação é seguir a velha receita que não deu certo nem no Morumbi, nem na maioria dos times. Mantê-lo é, ao menos, dar a chance de escrever uma história diferente.

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