Diretora da FPF: ‘Crise pode nos ensinar a fazer futebol mais sustentável’

O futebol está parado desde a segunda quinzena de março e ainda sem uma perspectiva exata de quando vai conseguir voltar. Clubes em crise, com cortes de verba de patrocinadores, sem conseguir acertar salários (e já negociando férias ou até reduções salariais), debatem com federações e CBF como podem ter algum apoio para se manter nesse momento. Claro que essa é uma realidade sem precedentes, de pandemia mundial que afeta a economia em absolutamente todos os aspectos. Mas para a diretora da FPF, Aline Pellegrino, há um recado que esse momento traz: o futebol ainda não é muito sustentável por aqui.

“É um momento grande de reflexão. A mensagem é clara: a gestão tem que ser mais sustentável. É hora de fazer essa reflexão, entender melhor de onde vem e para onde vai o dinheiro. Dá pra ser mais sustentável”, afirmou a ex-capitã da seleção brasileira e diretora de futebol feminino da entidade.

A constatação de Pellegrino é feita no momento em que se percebe que poucos clubes (mesmo entre os grandes do futebol masculino) têm caixa para passar por qualquer crise. Os times brasileiros, no geral, acabaram gastando tudo ou até mais do que ganham por mês e aí quando a fonte de recursos seca, não há uma reserva para manter o negócio girando. Naturalmente, haveria um impacto grande para qualquer equipe num cenário de perdas como esse (sem arrecadação com ingressos de jogos, sem pagamento de patrocinadores, e até mesmo com corte de verba de TV). Mas se todos tivessem uma reserva, esse impacto ao menos tenderia a não ser tão imediato.

“A crise evidencia, mais uma vez, um recado a todos do futebol: que você tem que gastar menos do que você arrecada. Ela pode nos ensinar a fazer futebol mais sustentável”, disse ela.

Aline Pellegrino é diretora de futebol feminino na FPF; em 2020, pela 1ª vez, Paulista feminino teria premiação para clubes (Foto: Rodrigo Corsi/FPF)

Muitos grandes clubes brasileiros já atrasavam salários de jogadores e acumulavam dívidas antes mesmo dessa crise chegar, o que mostra que a gestão do futebol por aqui ainda é muito falha. No caso do futebol feminino, que era um mercado em ascensão principalmente depois de um 2019 histórico com o sucesso da Copa do Mundo da França, imagina-se que o impacto de uma queda tão abrupta como essa seria ainda maior. Mas Aline Pellegrino vê a situação sob uma perspectiva um pouco diferente.

“Acredito que o futebol feminino num cenário desses pode se adaptar melhor. Porque sempre faltou (recurso). Nunca teve moeda na mesa. Então nisso a gente pode se adaptar melhor.”

É fato que o futebol feminino não teve de lidar com perda de verba da TV, porque essa verba não existe. Assim como o dinheiro de bilheteria, porque quase 100% dos jogos têm entrada gratuita. Ainda assim, há perda de patrocinadores e uma grande preocupação dos clubes sobre como se manter nesse período de incertezas. Por isso, a FPF decidiu fazer uma reunião nesta quarta-feira exclusivamente com os times femininos que participariam do Campeonato Paulista (marcado inicialmente para começar em 12 de abril, mas suspenso no momento por causa da pandemia) para decidir com eles as melhores estratégias para o momento.

Campeonato Paulista no ano passado registrou recorde de público para o futebol feminino na final com quase 30 mil pessoas na Arena Corinthians (Foto: Bruno Teixeira)

Havia 16 equipes confirmadas para o estadual das mulheres neste ano – quatro a mais do que em 2019. O torneio teria duração de quase cinco meses, até agosto, mas agora não se sabe quando ele vai acontecer. A ideia da reunião com os clubes é entender se todos ainda terão condições de participar do Paulista feminino e quais são as maiores preocupações deles até lá. A própria FPF ainda irá avaliar se conseguirá manter tudo o que estava planejado até aqui – essa seria a primeira temporada em que a entidade ofereceria premiação para campeão e vice, além de uma verba para todos os times participantes (seriam distribuídos R$300 mil no total). Com a queda de arrecadação da Federação, que é a maior financiadora do torneio feminino, é possível que alguns ajustes precisem ser feitos.

Por enquanto, a ideia é que qualquer decisão seja tomada em conjunto com clubes. No entanto, algumas medidas já estão sendo preparadas como iniciativas da FPF para ajudar as equipes nessa crise. Ainda não há definição sobre auxílio financeiro aos times (como a CBF fez com clubes das divisões nacionais do futebol feminino), mas uma iniciativa que a entidade pretende colocar em prática é proporcionar cursos de capacitação principalmente em gestão financeira para os times. Seria uma forma de aproveitar o momento difícil para estruturar melhor as finanças da equipe. Outras palestras online deverão ser disponibilizadas, como de saúde mental e outros temas relevantes em uma pandemia como essa.

Se grandes crises costumam trazer muitas lições para quem passa por elas, Aline Pellegrino prefere ser otimista quanto a essa que o futebol (e a sociedade como um todo) está vivendo por causa do coronavírus. “Vamos passar por isso e vamos voltar mais fortes”, finaliza.

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