Robinho condenado por estupro em última instância: e o futebol, vai absolvê-lo?

Quase 10 anos se passaram desde que o atacante Robinho foi acusado de ter cometido violência sexual contra uma mulher albanesa que, na época, tinha 23 anos. Após ter sido condenado em duas instâncias, o julgamento final do jogador na Itália foi marcado para esta quarta-feira, e a Justiça do país determinou que ele é culpado mais uma vez. Não cabe mais recurso para o caso.

Robinho não poderá ser extraditado para cumprir a sentença de nove anos de prisão na Itália porque a Constituição de 1988 proíbe a extradição de brasileiros.

O jogador, porém, corre o risco de ser preso em caso de viagem ao exterior – isso se a Justiça e o governo italiano fizerem um pedido internacional de prisão que poderia ser cumprido em qualquer país da União Europeia.

Dupla violência

A vítima albanesa que denunciou Robinho e outros cinco amigos relatou na denúncia que foi “embriagada e abusada sexualmente enquanto estava inconsciente”. As provas que levaram a Justiça a condenar Robinho na primeira instância foram conversas entre o jogador e seus amigos em que o próprio Robinho diz ” Estou rindo porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu”.

A defesa do jogador tentou utilizar um “dossiê” da vida privada da vítima na tentativa de prejudicar a imagem dela perante o juiz. Essas “provas” não foram consideradas no processo e representariam uma dupla violência à vítima, que teria sua índole questionada como se o comportamento dela na vida privada justificasse/explicasse uma violência sexual coletiva.

É muito comum no Brasil ver, em julgamentos de casos de estupros, a defesa do réu apresentando um conjunto de materiais sobre a vida particular da vítima, postagens de redes sociais em baladas ou com bebidas alcoólicas na tentativa de induzir o juiz a pensar que o comportamento da vítima seria o grande problema em questão, e não a acusação de violência. Isso aconteceu, inclusive, no julgamento do caso da jovem Mariana Ferrer em Santa Catarina, quando o advogado do réu usou fotos sensuais da vítima na audiência para criticar sua conduta. A situação gerou indignação nas redes sociais com a divulgação da #JustiçaPorMariFerrer.

Repercussão do caso Robinho

Faixa feita pelas torcedoras colocada em frente à sede do Atlético em 2017 (Foto: Divulgação)

Demorou bastante até que a condenação por crime de violência sexual tivesse alguma repercussão ou efeito nos rumos da carreira dele no futebol brasileiro. A primeira sentença aconteceu em 2017, quando ele vestia a camisa do Atlético-MG e pouco fez barulho à época. Robinho foi condenado em um dia e, no fim de semana seguinte, estava entrando em campo normalmente com a camisa do clube. À época, falamos do tema por aqui, mas a história pouco teve atenção dos grandes veículos.

O assunto só reverberou em 2020, quando o Santos anunciou a contratação do jogador. Com a manifestação de várias torcedoras(es) e jornalistas esportivas, o tema virou pauta na grande imprensa. Seria justo Robinho, um jogador condenado até então em primeira instância por um crime gravíssimo (violência sexual), seguir sua carreira com todos os holofotes que o futebol proporciona, sendo ídolo de milhões de crianças, sem ter cumprido nenhuma sentença, sem seque falar abertamente sobre o crime do qual havia sido acusado?

A pressão foi enorme em cima dos patrocinadores, que, por sua vez, pressionaram o Santos, e o clube cedeu. Cancelou o contrato com Robinho para que ele pudesse se concentrar na sua defesa. Em 2021, ele foi novamente condenado, agora em segunda instância. O julgamento final e definitivo foi nesta quarta-feira, com a sentença de nove anos de prisão considerando o jogador brasileiro culpado pelo crime.

 

Futebol não é mundo à parte

Infelizmente, pelo ambiente machista e misógino predominante no futebol, crimes contra a mulher costumam ser tratados com indiferença.

Jogadores são acusados de agredirem suas mulheres e seguem jogando. Eles são presos em flagrante por violência doméstica? Seguem jogando. Eles são condenados por violência sexual em primeira instância? Vida que segue —para eles.

+ Não foi a imprensa que agrediu sua esposa, Jean

Para as vítimas, a dor permanece. Nenhuma palavra dos clubes que os contratam, poucas palavras da imprensa que noticia (felizmente, isso começa a mudar), e muitas palavras de incentivo dos torcedores empolgados com os gols e as pedaladas dentro de campo. As acusações de crimes de violência contra a mulher com as quais esses jogadores estão envolvidos ficam em segundo plano. A vida delas não vale mais do que os três pontos no campeonato.

Como fenômeno social que é, o futebol tem um papel além do campo. E o mínimo que se pede aqui é o debate. Não vale só criar ações para o 8 de março ou fazer campanha de marketing contra o machismo.

O que os clubes efetivamente fazem para combater as violências às quais as mulheres estão expostas diariamente? Por que são cada vez mais recorrentes os casos de jogadores de futebol envolvidos em crimes de violência contra a mulher? Como o ambiente machista do futebol contribui para reproduzir comportamentos nocivos às mulheres?

Está mais do que na hora do futebol promover essa discussão. O silêncio também nos mata.

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