Palmeiras ‘salva’ campanha do Brasil na Libertadores, que precisa ser reformulada

Não é de hoje que temos falado sobre a evolução do futebol feminino na América do Sul. Depois de quebras de recordes de público nos estádios do continente e algumas seleções potencialmente mais fortes na Copa América e nos torneios internacionais de base, foi a vez da Libertadores Feminina atestar esse crescimento.

E o Palmeiras faz parte desse cenário. Estreante na competição continental, as Palestrinas garantiram vaga na final após vencerem o América de Cali por 1 a 0 e seguir com 100% de aproveitamento nesta edição.

Graças à classificação da equipe comandada por Ricardo Belli, o Brasil não teve seu pior desempenho na história do torneio. Corinthians, atual tricampeão, e Ferroviária, campeã em 2015 e 2020, foram eliminados nas quartas de final.

O adversário da final é mais uma surpresa. O Boca Juniors, que eliminou o Corinthians e nas semis enfrentou um dos favoritos ao título justamente por estar em um momento de evolução, o Deportivo Cali, eliminado nos pênaltis.

Calendário e planejamento podem justificar quedas

Campeão Brasileiro de 2022, o Corinthians viveu altos e baixos na temporada e lidou com situações até então não experimentadas desde que instaurou sua hegemonia no país a partir de 2016 (de lá para cá, o clube conquistou pelo menos um título por ano). O adversário principal foram as lesões.

De Gabi Zanotti a recém-contratadas, como Luana, o desempenho do time foi bem prejudicado (Brasileirão e Paulista) por ausências importantes. No campeonato estadual o clube paga o preço por não ter um investimento longevo de base, por exemplo.

E de boa parte da temporada comprometida pelas lesões, ainda assim o time venceu o nacional, mas sofreu o baque na Libertadores. O jogo de estreia marcou a primeira derrota do clube na competição continental feminina, o 2 a 1 para o Deportivo Cali evidenciou cansaço, sacrifício e erros individuais.

Em seguida, vitórias por duas goleadas para mostrar que não se pode subestimar o atual campeão, mas na fase decisiva, queda para o Boca Juniors por 2 a 1 e um duro golpe. “Mérito do adversário. O Boca é uma equipe confiante, bem treinada, sabe bem o que faz, sabíamos que seria difícil. Demérito nosso, jogamos muito mal, não fizemos uma grande competição. Estávamos crescendo para o mata-mata e não mostramos isso em campo. Como sempre faço, assumo a responsabilidade pelo resultado”, declarou Arthur Elias.

A Ferroviária por sua vez trocou de treinadora 1 mês antes de embarcar para a Libertadores Feminina. Jéssica de Lima chegou para o lugar de Roberta Batista. “Vamos enfrentar equipes copeiras, que gostam desse tipo de competição e que melhoraram muito no entendimento do jogo. Vai ser muito difícil o nível desse ano”, praticamente previu Jéssica em conversa com as Dibradoras já no Equador, local do torneio.

Na primeira fase, vitórias magras (1×0 no Club Ñañas-EQU e no Defensor Sporting-URU) e empate em 2 a 2 com o Boca, a princípio um grupo relativamente fraco, a não ser o adversário argentino. Ainda, perdeu durante o torneio a meio-campista Amanda, que sofreu ruptura de ligamento do joelho e está fora da temporada (Paulista e Brasil Ladies Cup).

Não era o melhor desempenho da Ferroviária, mas também não foi o pior. Mesmo com placares magros e precisando correr atrás do resultado, a equipe dava sinais de que poderia ir mais longe, e a interrupção da caminhada vem justamente de quem mais salvou o time de outras eliminações.

A virada do Deportivo Cali nas quartas de final aos 43 minutos do segundo tempo veio de uma falha de Luciana. Desde 2013 no clube, praticamente 200 jogos com a camisa grená e os títulos de Libertadores (2020), Brasileiro (2014 e 2019), Copa do Brasil (2014) e Paulista (2013), a goleira sentiu muito e chorou ao término da partida, dizendo “a culpa é minha”.

Virada de chave sobre questões não bem explicadas

A goleada sofrida pelo maior rival dentro da sua casa em jogo que valia vaga na final do Campeonato Brasileiro Feminino já ficou para trás? Parece que sim.

Não porque o Palmeiras se explicou sobre o afastamento da sua dupla de zaga no dia da partida, mas porque o grupo se uniu para deixar essa polêmica (mais uma dessa gestão palmeirense) no passado e seguir em busca de um único objetivo.

Talvez no grupo mais fraco da primeira fase, o Palmeiras fez o dever “de casa” e sobrou. Três vitórias em três jogos, 12 gols marcados e somente um sofrido, a segunda melhor campanha (só ficou atrás do Deportivo Cali por saldo de gols). Nas quartas ficou ainda mais claro a força mental da equipe nesta competição.

Contra o Santiago Morning, Day Silva veio do banco de reservas para marcar a virada nos acréscimos. Aliás, marcar daquele que tem sido um dos principais recursos do time no torneio: gol de cabeça. Até aqui já foram seis, incluindo o que garantiu o Palmeiras na final no 1 a 0 diante do América de Cali (Ary Borges).

A linha de três com Poliana, Julia Bianchi e Katrine tem dado certo. Atletas de seleção brasileira como Ary Borges e Bia Zaneratto estão em alto nível. Oito jogadoras das que estão no Equador já venceram essa competição, outras nove estão estreando no torneio.

Formato antigo que prejudica desenvolvimento do torneio

De fato o ajuste na premiação de 85 mil dólares para 1,5 milhão de dólares ao campeão desta temporada foi uma bola dentro da Conmebol. Mas, infelizmente, a entidade segue negligenciando a Libertadores Feminina (seu principal produto na modalidade).

A começar por ser um torneio de tiro curto, onde em duas semanas tudo se resolve. O Palmeiras, finalista, conquistou a vaga em uma quarta-feira e irá decidir o título dois dias depois (na sexta). “Tem muita coisa a ser melhorada, a gente indo para uma final com um dia de descanso é uma coisa surreal. Estamos praticamente esgotadas, viemos de quartas e semifinal muito difíceis”, falou Bia Zaneratto.

Eliminada com o Corinthians, Tamires também se posicionou por melhorias na competição. Um dos pontos destacados pela atleta é a baixa qualidade nos gramados e locais de treino, o que expõe ainda mais a saúde das competidoras.

A arbitragem também é um problema sério na Libertadores Feminina. Erros gravíssimos não são exceção e o VAR está restrito apenas ao jogo decisivo. “A arbitragem dá muita falta, especialmente para os adversários, um pouco menos para nós. É uma tendência da arbitragem que me estranha muito, algo com que já convivemos há muitas Libertadores. Ao invés de igualar, melhorar a condição da arbitragem, a gente vê que só piora. Não sei o que podemos fazer, fizemos de várias maneiras não é de hoje. Em relação às jogadoras, são situações dentro de campo, não vejo deslealdade, todo mundo está preparado para defender seu clube. É situação da arbitragem ser justa nos critérios que dentro do campo a coisa resolve”, disse o técnico Arthur Elias em entrevista ao ge.com.

Se presenciamos neste ano uma crescente do público nos estádios para ver o futebol de mulheres, o mesmo não acontece na competição continental. Realizada no Equador, mesmo local da final do masculino, a Libertadores Feminina não teve adesão nem perto do ideal.

A Conmebol segue na contramão do que pede a modalidade nos dias atuais e do que vem fazendo a Uefa com a Eurocopa Feminina. É muito importante que clubes, atletas e marcas se posicionem cobrando melhorias, afinal, o interesse no crescimento deve ser de todos os agentes envolvidos.

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