CBF mostra descaso com futebol feminino em despedida de Formiga

Um dos maiores nomes da história do futebol está prestes a se aposentar da seleção brasileira e, até agora, não há informações sobre como o torcedor poderá prestigiar a partida in loco. A despedida de Formiga acontecerá nesta quinta-feira na Arena da Amazônia, em Manaus, e a CBF ainda divulgou detalhes sobre os ingressos para a partida somente na manhã desta terça-feira.

A situação evidencia o descaso que a confederação segue tendo com o futebol feminino. O último jogo de Formiga pela seleção deveria ser o principal evento do ano para a CBF. O mínimo, mas o mínimo mesmo que ela merece, é a Arena da Amazônia lotada (ou com a capacidade máxima de momento permitida em tempos de covid, que é de 30 mil pessoas) com a torcida gritando seu nome. Mas as pessoas não conseguem ir a um jogo que elas mal sabem que irá acontecer. E a divulgação da despedida desse ícone do futebol ficou bem atrasada – inclusive, quem está em Manaus não vê sinais de que um jogo deste tamanho está para acontecer daqui a dois dias.

 

O anúncio do jogo de despedida em Manaus aconteceu no dia 9 deste mês, durante a convocação da seleção feminina para as datas Fifa e novembro. Até a noite desta segunda-feira, não havia sequer informação sobre o horário da partida na quinta-feira. Tudo o que se sabia era que Brasil e Índia se enfrentariam na quinta-feira. Às 20h de segunda, a CBF informou o horário da partida – 22h (de Brasília, 21h na hora local em Manaus). Somente nesta terça-feira, às 10h, a entidade divulgou o site para compra de ingressos – o mais barato é R$80.

Não é de hoje que a CBF demonstra total descaso com o futebol feminino. Inclusive outros grandes nomes da seleção não tiveram sequer a oportunidade de se despedir. Sissi, uma das maiores camisas 10 que o mundo já viu, saiu da seleção sem a oportunidade de ter um último jogo, sem ter sua história valorizada pela entidade que representou por tantos anos. O mesmo aconteceu com Pretinha, Roseli e outros grandes nomes.

Formiga chegou a se despedir em uma partida em Manaus em 2016, mas voltou atrás (Lucas Figueiredo/CBF)

Aliás, a história da seleção feminina por muito tempo não foi contada pela própria CBF, que criou um Museu da Seleção na sua sede no Rio de Janeiro sem mencionar absolutamente nada das mulheres que vestem ou vestiram a camisa amarela.

As coisas têm mudado nos últimos tempos, é verdade, e isso acontece graças a luta de muitas mulheres que, inclusive, hoje ocupam cargos dentro da CBF e cobram mais apoio da entidade ao futebol feminino. Esse jogo de despedida de Formiga não estaria acontecendo não fosse a presença de Duda Luizelli na coordenação de seleções e de Aline Pellegrino na coordenação de competições femininas. As duas, ex-jogadoras, também são responsáveis por criar um outro evento em homenagem às pioneiras do futebol feminino, que deve acontecer em 10 de dezembro na Granja Comary, em Teresópolis.

Mas os tantos homens que ainda comandam a CBF seguem ignorando como podem o futebol das mulheres. Não seria admissível que a dois dias da despedida de um grande nome da seleção masculina, por exemplo, não houvesse qualquer informação sobre o jogo. Esse cenário nunca teria acontecido se o protagonista dessa partida fosse um homem.

Para efeito de comparação, nos Estados Unidos, uma jogadora importante da história recente da seleção se aposentou neste ano, e a US Soccer preparou uma grande festa para o seu adeus. Carli Lloyd foi aplaudida por um estádio lotado numa despedida que emocionou até quem não é americano.

 

É como se a confederação não quisesse ver o estádio cheio para homenagear a jogadora que passou 26 anos dedicando sua vida à seleção brasileira. É como se a entidade não entendesse, de fato, o tamanho de Formiga para o futebol e para o esporte brasileiro. Ninguém deixará um legado maior do que o dela.

Foram quase três décadas vestindo a camisa da seleção, deixando tudo no campo, e recebendo nada em troca. São 26 anos e, na maior parte desse período, não havia condições básicas para jogar futebol – nem mesmo na seleção brasileira. E, diante de tudo isso, Formiga não desistiu. Seguiu lutando por respeito, por reconhecimento, pelo direito que as mulheres tinham de jogar, tanto quanto os homens. Quantas vezes o rosto dela foi estampado nas entrevistas após eliminações em Copas e Olimpíadas com os questionamentos que deveriam ser direcionados aos dirigentes que ignoraram a modalidade por tanto tempo.

Sete Copas do Mundo, sete Olimpíadas, recordista absoluta de jogos pela seleção brasileira (entre homens e mulheres). Ninguém fez mais para honrar essa camisa do que ela. E nem mesmo em sua despedida, Formiga terá o reconhecimento que merece.

Mas para azar dos cartolas da confederação, que tanto fazem para impedir o crescimento do futebol feminino, ele resistirá. Mais forte do que nunca, honrando o nome das jogadoras que tanto lutaram para colocá-lo no topo. Pelo legado de Formiga, não desistiremos de cobrar a CBF pelo que o futebol feminino merece.

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