‘Quero ganhar uma Copa do Mundo’: mais que sonhar, na peneira elas vão realizar

Curitiba, Zona Sul de São Paulo e Pirajú são algumas das localidades que contaram com representantes femininas na 2ª Peneira Sub-17 organizada pela Federação Paulista de Futebol (FPF) no Centro de Práticas Esportivas da USP, entre os dias 14 e 15 de outubro.

Seja acompanhadas das mães, pais, tias ou educadoras esportivas, as garotas se dedicaram integralmente ao futebol durante meio período e, claro, foram observadas sob os olhares atentos dos responsáveis.

Ruth Bessa Santana trouxe duas garotas de mesmo nome para a peneira, Graziele Kerolaine, goleira de 14 anos e Graziele Borges, de 16. As duas moram na Favela do Moinho, que fica no Centro de São Paulo e jogam futebol no Coletivo Rosa Negra Ação Direta e Futebol.

“Elas começaram a treinar porque o Rosa Negra foi participar de um campeonato lá no campo que fica dentro da favela e as meninas que moram lá viram as mulheres jogando e sentiram vontade de treinar mais sério, Isso foi em 2017, se não me engano”, contou Ruth que é jogadora de várzea, colaboradora do projeto e uma das pessoas que dão treinos de futebol para as garotas.

O projeto oferece treinamento gratuito para as meninas e conta com doações de bola, chuteiras, material esportivo para manter a iniciativa ativa. “Nossa ideia também é que elas treinem com outras meninas e ocupem outros espaços para além do lugar onde elas moram e vivem. Vamos encaminhar amistosos com outros times e jogar em outros espaços”, contou.

Além das duas garotas do Rosa Negra que estiveram na quinta-feira na peneira, mais uma da comunidade estará na seletiva nesta sexta-feira. O nome dela é Maria e ela já participou da 1ª edição da peneira em 2019.

Presença paterna

Os pais também estavam no CEPEUSP acompanhando suas filhas. Um deles era Luciano Cruz, pai da Lorena de 14 anos e que veio de Vinhedo para levar sua filha única em sua 1ª peneira. “Ela sempre gostou de esporte. Fez judô e depois o futebol, agora joga na escola e no clube Rocinhense, lá de Vinhedo. E vou te falar que, quando minha mulher engravidou, eu disse que queria ter uma menina pra jogar futebol”, contou.

José, pai de Luana e Luciano, pai de Lorena (Foto: Dibradoras)

Segundo o pai, Lorena acompanha muito o futebol dos Estados Unidos e se inspira em Alex Morgan e Megan Rapinoe. Outro fator que ajudou a fortalecer o vínculo da filha com o futebol foi a chegada do time feminino do Palmeiras na cidade onde eles moram. “Depois disso, eu passei a acompanhar mais o futebol feminino com ela. E torço mais por elas do que pro masculino hoje em dia”, revelou.

Outro pai presente na seletiva foi José Wilson Birocchi, que saiu de Piraju (400km de São Paulo) para levar a filha Luana, de 14 anos para o teste. O pai trabalhava em um bar que ficava dentro de um campo de futebol e a filha, com sete anos, perguntou se também poderia jogar. “Só tinha meninos jogando, o professor deixou ela jogar e desde então ela não parou mais. Ela se impôs em campo, só tem ela de menina e eles deixam ela jogar”, afirmou.

Acostumada a jogar entre os garotos, o pai revelou que a peneira realizada pela FPF foi apenas a 2ª vez que sua filha jogou entre meninas. “Ela fez uma avaliação no Corinthians recentemente e eu resolvi trazer para mais uma experiência agora. Ela joga de meia-direita e é muito dedicada, nunca falta em treinos. Já está famosinha na cidade, viu?”, revelou aos risos.

As gêmeas da peneira

Vanessa Bona veio de mais longe. Ela dirigiu por quatro horas e meia de Curitiba até São Paulo para tentar realizar o grande sonho das gêmeas Giovanna Arthur da Silva e Isabella Arthur da Silva, de 15 anos. Ela é amiga dos pais das garotas e assistiu atentamente ao treino, tirando fotos e avisando os familiares sobre o que acontecia ali.

Giovanna e Isabella viram de Curitiba (Foto: Dibradoras)

Segundo Vanessa, Giovanna sempre gostou de futebol, desde muito pequena. Já Isabella, passou a gostar da bola um pouco mais tarde, por influência da irmã. “As duas se destacam muito, mas no colégio é aquela coisa, nunca tem time feminino, os meninos não deixam elas jogar e elas relatam isso”, contou Vanessa.

Atualmente, as gêmeas de Curitiba encontraram um lugar para jogar entre as meninas, em um time chamado Gurias Futebol Clube. Segundo Vanessa, o apoio dentro de casa é muito forte. “A mãe leva em todos os lugares. Em junho, a Giovanna foi levada ao Avaí para fazer um teste. Ela ficou uma semana por lá, mas não conseguiu jogar um campeonato porque a Federação Paranaense demorou pra entregar a documentação para a Federação de Santa Catarina. Ela adorou e é isso que ela quer, ser jogadora de futebol.”

Rita de Cássia também estava acompanhando gêmeas, mas eram suas filhas Yasmin Rodrigues Lima e Stefany Rodrigues Lima, também de 15 anos. Elas moram no Jardim Lídia, Zona Sul de São Paulo e, segundo a mãe, o amor que elas sentem pelo futebol vem “desde a barriga”.

Stefany (de coque), a mãe Ruth e a irmã Yasmin (Foto: Dibradoras)

“Eu dava boneca pra elas, diversos brinquedos e elas trocavam tudo pela bola. Tentei colocar no balé, aula de dança e elas diziam que gostavam de futebol. Começaram a jogar na escola com os meninos e os professores me falavam ‘mãe, investe nessas meninas’. Várias vezes chegaram chorando em casa porque os meninos não deixavam elas jogar no mesmo time que eles e eu dizia ‘calma filhas, isso um dia vai mudar’. Elas cresceram e eles viram que elas eram boas jogando e ainda assim, eles não queriam jogar contra elas. ‘Não queremos perder para as gêmeas’, eles diziam. Só de uns dois anos pra cá é que começaram a aceitar as duas”, revelou Rita.

As gêmeas confirmaram a versão da mãe. “Os meninos achavam que a gente não sabia jogar pelo fato de sermos meninas e, se deixassem a gente jogar, não tocavam a bola para nós. Era a mesma coisa que nada”, revelou Stefany.

Atualmente, as duas jogam no Juventus Academy Aricanduva – uma equipe amadora – e também treinam no Sesc de Pinheiros com outras garotas e disputam campeonatos. A mãe nem sempre consegue acompanhar as filhas nos jogos e treinos, mas juntas, elas se deslocam pela cidade.

“Elas saem da escola, passam em casa, trocam de roupa, almoçam, pegam o metrô e vão. Eu não dava conta de acompanhar porque elas treinam todos os dias e de final de semana tem campeonato e viagem. Mas sempre que posso, eu venho, gosto de acompanhar. Elas são meninas de muita força, eu admiro demais!”

As gêmeas jogam na lateral e também na zaga. Para não serem confundidas, o penteado do cabelo faz a diferença. “Ou olham pela cor da chuteira ou para o cabelo”. Entre as inspirações das irmãs, Marta é unanimidade e Stefany também revelou admirar o futebol de Tamires, jogadora do Corinthians e da seleção brasileira. E o sonho das duas? “Quero ganhar uma Copa do Mundo!”, afirmaram.

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