O Chelsea finalmente chegou a uma final de Champions League. Um dos melhores e mais consistentes trabalhos do futebol feminino europeu, o clube inglês terá a chance de disputar o principal título do continente, e isso se deve muito à dedicação de uma das principais treinadoras do mundo hoje. Emma Hayes levou o Chelsea ao ápice e se tornou a primeira mulher no comando de um clube a chegar a uma final de Champions League nos últimos 12 anos.
E a forma como isso aconteceu mostra ainda mais a força dessa equipe liderada por ela. Com a derrota por 2 a 1 no primeiro jogo da semifinal para o Bayern de Munique, o Chelsea estava devolvendo o placar e levando a decisão da vaga na final para os pênaltis até os 39 minutos do segundo tempo.
Foi aí que as craques do time fizeram a diferença. Pernille Harder fez o gol redentor faltando seis minutos para acabar e, nos acréscimos, Fran Kirby garantiu a goleada por 4 a 1 para selar a classificação merecida do Chelsea à final da Champions.
As reações de Emma Hayes na beira do gramado mostram o que essa vitória significa para ela. “Eu trabalhei a minha vida toda por esse momento”, afirmou ela.
“Eu queria muito viver isso. Essa foi a semana mais longa do mundo. Eu tive que fazer de tudo para controlar as emoções. Só queria que esse jogo chegasse. Não consigo descrever o que estou sentindo, quase não consigo segurar as lágrimas”.
Dá para entender o tamanho da emoção da treinadora. Chegar a uma final de Champions League era o passo que faltava na sua vitoriosa carreira à frente do Chelsea. E essa tem sido uma temporada especial. Foram apenas duas derrotas e uma sequência de 33 jogos sem perder – quebrada em 7 de fevereiro pelo Brighton, quando o Chelsea chutou 30 vezes no gol contra 3 do adversário, mas acabou derrotado por 2 a 1.
A temporada pode terminar com mais um título inglês para a treinadora, que já é tricampeã da WSL, a primeira divisão do Campeonato Inglês feminino. O Chelsea está em segundo na tabela, mas com um jogo a menos do que o Manchester City e, se vencer o Tottenham na quarta-feira, retoma a liderança. Aí faltará apenas uma rodada para os Blues confirmarem o título.
Uma das pioneiras como treinadora na Inglaterra, Emma Hayes tem uma trajetória inspiradora e, no dia 16 de maio, ao enfrentar o Barcelona na final da Champions League, deixará seu nome na história mais uma vez como a primeira treinadora a chegar à decisão após 12 anos.
Emma Hayes is the first female coach to reach the Women’s Champions League final in 12 years
It’s also Chelsea’s first Women’s Champions League final appearance.
Look at what it meant to her ❤️ pic.twitter.com/oySthFZi4c
— espnW (@espnW) May 2, 2021
A última a conseguir esse feito havia sido Martina Voss-Tecklemburg (atual técnica da seleção alemã), que levou levou o FCR Duisburg ao título na temporada 2008-2009. A também alemã Monika Staab é outra técnica que conseguiu o título europeu em 2002 com FFC Frankfurt – e chegou a final com a mesma equipe em 2004. Ao longo dos 20 anos de torneio, somente essas duas mulheres conquistaram o título como técnicas.
Desde que a competição foi rebatizada como “UEFA Women’s Champions League”, na temporada 2009-2010, não houve nenhuma treinadora na final.
Conquista marcante em 2018
Aos 41 anos em 2018, Emma Hayes estava no oitavo mês de uma gravidez de gêmeos e teve uma das conquistas mais significativas da sua carreira: o segundo título da FA Cup à frente do Chelsea.
O jogo aconteceu no lendário estádio de Wembley e contou com um recorde de público para o futebol feminino em competições nacionais na Inglaterra à época. Um total de 45.423 pessoas preencheram as arquibancadas para acompanhar Arsenal Women 1 x 3 Chelsea Ladies, 10 mil a mais do que o registrado na final do mesmo torneio em 2017.
Mas um dos grandes destaques do jogo foi mesmo a presença de Emma Hayes no gramado, no auge da gravidez, comemorando o título com suas jogadoras. Ela deixou seu assistente Paul Green à beira do campo na época durante a partida porque teve recomendações médicas para “pegar leve” nessa reta final. No entanto, Hayes conversou com as atletas no intervalo do jogo e seu papel foi fundamental na conquista.
A gravidez costuma ser vista como empecilho para as mulheres no mercado de trabalho e, nesta conquista ainda em 2018, a treinadora também defendeu seu direito “biológico” de ser mãe, mesmo num campo de futebol.
“Para mim, é importante que as pessoas percebam que a gente pode fazer as duas coisas (ser técnica de futebol e estar grávida). E é meu direito biológico, eu ainda posso levantar da cama e ir para o trabalho todos os dias. É importante para minha mente e para minha saúde me manter trabalhando, só preciso fazer as coisas certas e dormir direito”, disse.
Ela deu à luz um menino dez dias após a conquista do título. Ela havia recebido a notícia de que um dos gêmeos não havia sobrevivido ao terceiro trimestre da gravidez, mas não quis dar a notícia às jogadoras para não correr risco de elas se abalarem na reta final dos campeonatos. Hayes conta que até hoje sente a perda de um dos bebês, algo que trouxe muito aprendizado. Três meses depois do nascimento de Harry, ela estava de volta ao trabalho.
Reconstrução do Chelsea
Emma Hayes fez parte do projeto de reconstrução do time feminino do Chelsea nos últimos anos e a classificação inédita para a final da Champions League vem para coroar esse trabalho.
Hayes chegou ao clube em 2012, após ter acumulado experiência como assistente no Arsenal e depois como técnica do Chicago Red Stars nos Estados Unidos. À época, a equipe dos Blues vinha de um campeonato ruim na WSL1 (a Women’s Super League, primeira divisão do Campeonato Inglês de futebol feminino), acumulando uma sequência de 10 derrotas em 12 jogos. E a treinadora veio para estabelecer outra conquista também fora de campo – por algum tempo, ela foi a única mulher a comandar uma equipe de futebol feminino no torneio.
Com um trabalho feito a longo prazo, Hayes conseguiu levar as “ladies” do Chelsea ao topo. O primeiro título veio na temporada 2014-2015 com a conquista da FA Cup, derrotando na fase final o Arsenal por 2 a 1, o Manchester City por 1 a 0 e depois o Notts County na final por 1 a 0 com o público de 30.710 pessoas em Wembley.
Em 2015, ela também conquistou pela primeira vez a WSL1, depois em 2017 levantou mais uma taça, desta vez a do torneio interino da WSL criado durante a mudança do calendário da principal competição inglesa no futebol femininoo. Em 2018, levou o time à inédita semifinal da Champions League, perdendo apenas para o já tradicional Wolfsburg, um dos maiores campeões do torneio continental. No mesmo ano, conquistou o título da WSL, feito que repetiria na temporada 2019-2020.
Mas Emma Hayes não gosta de se ver como um “exemplo a ser seguido” apenas por ser mulher. Ela quer ser reconhecida como boa técnica que é.
“Vocês me chamam de exemplo por eu ser mulher. Claro que eu quero influenciar outras mulheres no futebol, mas eu quero ser reconhecida por ser boa técnica taticamente, por formar um bom time, por conseguir tirar o melhor das minhas jogadoras, que estão disputando título ano sim, ano não”, afirmou à BBC ainda em 2018.
“As coisas ficam mesmo mais difíceis quando não há muitas de nós fazendo isso (sendo técnicas), mas temos que acabar com a conversa específica sobre gênero. Eu apenas me vejo como técnica de futebol e só”, concluiu.
Uma resposta
Excelente matéria. Acompanho o Chelsea e foi muito bom ler uma matéria tão completa sobre Emma Hayes, essa pessoa tão importante para o futebol na Inglaterra e no mundo. Aliás, matéria boa como sempre… Vcs arrasam!