Seguindo clubes há 50 anos, elas viraram símbolo de Corinthians e Cruzeiro

*Por Renata Mendonça e Roberta Nina

Dia de final de campeonato é sempre dia de nervos à flor da pele para os torcedores dos clubes envolvidos na decisão. Para dona Sílvia e dona Salomé não é diferente. Apesar de já passarem por essa experiência há pelo menos 50 anos acompanhando seus times do coração, o frio na barriga e a ansiedade para o jogo são sempre constantes em dias assim.

Corinthians e Cruzeiro decidem nesta quarta-feira o título da Copa do Brasil, e as duas estarão na torcida, uma de cada lado, para que seus clubes saiam campeões. Dona Silvia tem 58 anos e é torcedora símbolo do Corinthians. Dona Salomé vai fazer 85 na segunda-feira e não há cruzeirense que frequente o Mineirão e não a conheça. Aqui, trazemos as histórias dessas duas apaixonadas por futebol.

Com o Corinthians e pelo Corinthians

– Como foi que a senhora se tornou corinthiana?
– Eu não me tornei, eu nasci Corinthians!

Silvia, torcedora fanática do Timão (Foto: Arquivo pessoal)

Foi assim que Silvia Mara de 58 anos respondeu a primeira pergunta que fizemos sobre seu time de coração. A torcedora nasceu em Marília (interior de São Paulo) e toda sua família é corinthiana.

“Minha tia trabalhava na cantina da Gaviões da Fiel, fazia a famosa feijoada, e ela morava em frente à quadra. Eu cresci ali dentro”, contou a torcedora às dibradoras.

“Eu vou ao estádio desde criança, lembro de minhas idas ao Pacaembu com meu tio Raul e meus primos. Meu tio levava a torcida do Corinthians dentro da sua perua e íamos para o estádio”, contou.

Silvia não casou e não tem filhos. Seu maior compromisso é com o Corinthians e essa obrigação ela cumpre com maestria. É conhecida na torcida alvinegra como “Tia Silvia”, está presente em todos os jogos, viaja o mundo para ver seu time jogar e desfila na Escola de Samba Gaviões da Fiel Torcida há mais de 15 anos.

Silvia hoje faz parte da Ala das Baianas da Gaviões da Fiel (Foto: Arquivo pessoal)

Formada, pós graduada e mestranda em Educação Física, Silvia agora é aposentada e ao lado de suas amigas Laíde de 76 anos e Lourdes, de 84, marca presença nos jogos do Corinthians. “Vamos em todos os jogos, não é de vez em quando, não! Somos amigas há muito tempo”, revelou.

Com as amigas Lourdes e Laíde na arquibancada (Foto: Arquivo pessoal)

E com o Corinthians e pelo Corinthians, Silvia vai onde for preciso. “Já fui ver jogo fora de São Paulo, fui pra Montevidéu, Chile, Bogotá, Medellin e pro Japão. No Domingo eu vou pra Bahia (Vitória e Corinthians jogam pelo Brasileiro). Minha maior alegria é quando volto pra casa com os três pontos”, contou.

Silvia viaja sempre com a torcida organizada do Corinthians e, claro, já enfrentou perrengues e confrontos. “Já tomei cacetada, gás de pimenta na cara. É ruim, mas já acostumei. Os meninos da torcida sempre estão por perto olhando por nós, mas tem jogos em estados mais tensos que eu nunca fui, como por exemplo, em São Januário. Rio de Janeiro, Minas Gerais também são perigosos pra ir”, completou.

Silvia no Chile pelo Corinthians (Foto: Arquivo pessoal)

Para ver o Corinthians ser campeão Mundial no Japão, Silvia juntou férias, décimo terceiro e foi. “Eu estava nos dois títulos mundiais do Corinthians”. E a torcedora também acompanhou o rebaixamento do time em 2008. “Estava em Porto Alegre no jogo contra o Grêmio. Depois jogamos a Série B e eu fui em todos os jogos. Fomos campeões invictos”, recorda a torcedora.

Silvia com a torcida corinthiana no Japão (Foto: Arquivo pessoal)

A alvinegra se orgulha de estar presente em todos os momentos que o Corinthians entra em campo. “Em 2012 ganhei uma homenagem em forma de placa da Gaviões da Fiel porque eu acompanhei todas as partidas do time. De janeiro a janeiro, sem faltar em um”, orgulha-se.

Placa em homenagem a Dona Silvia (Foto: Acervo Pessoal)

Entre os ídolos do passado, Silvia tem muito carinho pelo Doutor Sócrates, Basílio e Biro-Biro. Do elenco atual, admira muito o Jadson, o Ralf e o Danilo, um de seus preferidos.

(Foto: Arquivo pessoal)

Silvia Mara esteve no treino aberto que o Corinthians realizou antes da final da Copa do Brasil contra o Cruzeiro e estará hoje em Itaquera. “Fico no norte, sempre com a organizada atrás do gol. Lá em cima tem um bom espaço pra eu e minhas amigas sentarem”, revelou.

“Hoje dá pra ser campeão sim e com a força da torcida, dentro de casa, ninguém segura o Corinthians.”

‘Vivo do Cruzeiro’

Foto: Divulgação Cruzeiro

Dona Salomé nasceu em Bom Despacho, uma cidade de menos de 50 mil habitantes a 160 quilômetros de Belo Horizonte, mas desde cedo teve paixão pelo Cruzeiro. Ela conta que foi amor ao primeiro azul e branco que viu no campo – que, no caso, era seu futuro marido jogando no time dos solteiros na pelada contra os casados na sua cidade. Foi assim que começou e nunca terminou a paixão dela pelo time celeste.

“O Cruzeiro às vezes me faz sofrer, mas no fundo é só alegria. Só me trouxe coisa boa nessa vida”, afirmou às dibradoras.

Ela se mudou para Belo Horizonte em 1958 para trabalhar em casa de família quando o Mineirão sequer existia. Mas desde a inauguração do estádio em 1965, ela segue o Cruzeiro na arquibancada em todo o jogo, sem falta – quer dizer, com apenas 24 faltas em 53 anos de estádio.

Foto: Reprodução Youtube

Dona Salomé ainda se lembra saudosista dos tempos em que não havia torcida única e a convivência entre os torcedores rivais era mais pacífica.

“Lembro um título do Mineiro, quando o Cruzeiro foi campeão em cima do Galo, na época não era como é agora. Era o Mineirão velho, tinha as duas torcidas, não tinha briga. Nós pegávamos ônibus aqui tudo junto. Era uma delícia, tenho muita saudade desse tempo”, contou.

Outra grande alegria que o Cruzeiro deu para Salomé foi a de contratá-la para trabalhar nas dependências do clube na década de 1990. Há 22 anos, ela é faxineira no Parque Esportivo do Barro Preto, uma das sedes do clube e conta que já até recebeu convites para mudar de emprego e ganhar melhor, mas o trabalho hoje significa viver a paixão dela diariamente – e isso dona Salomé não troca por nada.

“Eu constumo dizer que não vivo de dinheiro, vivo do meu Cruzeiro. Não troco esse emprego por nada. E não paro em serviço. Vivo caindo, mas sei me levantar. Sou forte, mulher de aço”, diz.

Dona Salomé trabalha em uma das sedes do Cruzeiro há 22 anos (Foto: Divulgação Cruzeiro)

Diante dessa história, dona Salomé virou torcedora símbolo do Cruzeiro e é quase que uma celebridade no Mineirão. Ela frequenta sempre o mesmo lugar na arquibancada, costuma ir aos jogos de ônibus de Contagem, onde mora, e chega em casa de volta muitas vezes de madrugada, por volta de 2h da manhã. “Mas às 5h já estou de pé para ir trabalhar de novo”, relata.

O ânimo para acordar é ainda maior quando o Cruzeiro sai com a vitória. E é isso que a torcedora espera para esta quarta-feira. Na segunda, ela faz aniversário e completará 85 anos de vida. “Espero que possa comemorar também o hexa do meu Cruzeiro”, diz, otimista.

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