Sissi recebe homenagem fora do Brasil, mas é ‘esquecida’ pela CBF

(Foto: Salón de la Fama del Futbol Internacional)

*Por Renata Mendonça e Roberta Nina

No último dia 12 de novembro, Sissi do Amor esteve na cidade Pachuca, no México, para receber (mais) um prêmio importante em sua carreira. Essa foi a primeira vez que o Salón de la Fama Internacional incluiu mulheres entre as homenageadas e a jogadora brasileira, ex-camisa 10 da seleção brasileira, foi uma delas.

Ao lado de outros 11 nomes, Sissi passa a figurar um “Hall da Fama” de personalidades importantes do mundo futebolístico e em seu discurso, declarou que o reconhecimento é  uma motivação para continuar alcançando seus sonhos.

“Eu não apenas represento meu país, mas também o futebol feminino. Meu sonho ainda está vivo, eu sei que ainda tenho muito a alcançar e esse reconhecimento é um passo muito importante. Quero ser alguém que realmente faça a real diferença no futebol feminino no Brasil ou onde quer que ele esteja. Quero ter a certeza no final de tudo que o que fiz e conquistei não foi só para mim, e sim para todas as meninas que são apaixonadas pelo futebol como eu.”

“Acredito na minha força e capacidade de estar a frente de um time, seja de crianças ou de mulheres numa seleção.”

Artilheira da Copa do Mundo de 1999, Sissi é uma das pioneiras do futebol no Brasil. Ela esteve no primeiro Mundial experimental organizado pela Fifa em 1988, quando as mulheres sequer uniforme do seu tamanho tinham para disputar um torneio – elas usavam o que sobrava dos homens. Em um momento em que o futebol feminino despontava no mundo após décadas de proibição em vários países (Brasil, Inglaterra, Alemanha), Sissi era um gênio da bola. Exímia meio-campista, camisa 10 clássica, tinha habilidade sem igual e cobrava falta como poucas (e poucos).

Foto: Getty

Na época dela, porém, não havia qualquer investimento ou reconhecimento da CBF ao futebol feminino. Sissi, aliás, era uma das líderes das jogadoras na hora de reivindicar o mínimo da confederação. Isso fez com que ela não fosse muito bem-quista ali. O maior nome da seleção brasileira antes da Marta encerrou a carreira e nunca recebeu qualquer homenagem da maior entidade do futebol nacional. Não há sequer uma menção a ela no Museu da Seleção Brasileira, montado na sede da CBF. E a mulher que um dia foi rejeitada no seu país por conta de um cabelo curto, hoje é muito mais reconhecida fora do território brasileiro do que por aqui. Atualmente, Sissi atua como técnica de clubes de base nos Estados Unidos e lá é vista como um grande ídolo para as meninas.

Questionamos a CBF sobre a falta de reconhecimento aos feitos de Sissi. A entidade se posicionou por meio de nota:

“Em 2015, Sissi foi convocada como assistente pontual da Seleção Brasileira de futebol feminino. Um reconhecimento pelo que a jogadora fez durante a carreira e também pelo que ainda pode contribuir para o fortalecimento da modalidade. Na ocasião, ela fez parte da comissão técnica no amistoso disputado contra os Estados Unidos. Com relação ao Museu Seleção Brasileira, há um espaço dedicado às conquistas das Seleções Femininas, com exposição dos troféus, mas sem homenagem personalizada a nenhuma atleta, a exemplo do que ocorre com as Seleções Masculinas. A CBF considera um orgulho o fato de Sissi integrar o Fifa Legends, o que demonstra sua relevância no universo do futebol. Como jogadora, a última vez que ela defendeu a Seleção Brasileira foi em 2000, na campanha que terminou com o quarto lugar dos Jogos Olímpicos de Sidney”.

Foto: Reprodução TUDN

Se não for pra fazer menção no Museu para contar a história tão linda de Sissi no futebol, o mínimo que a CBF poderia fazer era chamá-la para uma homenagem em algum evento no Brasil. Marta precisou ganhar seis prêmios de melhor do mundo para que a entidade reconhecesse seus feitos, estampasse seu rosto na fachada do prédio e fizesse uma homenagem na premiação do Brasileirão em 2018. Sissi também merece algum reconhecimento.

Sissi 

Muito antes de Marta ser a rainha do futebol, foi Sisleide Lima do Amor quem vestiu a camisa 10 verde e amarela e encantou o mundo com sua habilidade. A jogadora fez parte da primeira seleção brasileira de futebol formada em 1988 e no Mundial de 99, ganhou notoriedade ao marcar sete gols no torneio e ajudar a equipe feminina a alcançar uma medalha de bronze – algo impensável naquela época, já que o investimento no futebol feminino era praticamente nulo.

Mesmo com talento de sobra e ganhando campeonatos no Brasil – foi o grande nome do São Paulo entre 1997 e 2000 – Sissi enfrentou muito preconceito dentro e fora de campo. Seu posicionamento firme, exigindo melhorias para o futebol das mulheres e seu cabelo raspado eram vistos como problemas e não causavam boa impressão entre o alto escalão da CBF. Tanto é que em 2001, a organização do Campeonato Paulista impôs que era proibido a participação de mulheres com cabelo curto porque era necessário “enaltecer a beleza das jogadoras para atrair o público masculino”.

“Em 2001, teve o Campeonato Paulista e aí fizeram essa regra da beleza. Tinham me convidado antes para voltar a jogar no Brasil. Eu falei: dane-se, não preciso disso. Será que é tão difícil entender que o que a gente quer fazer é jogar e não mostrar beleza? A gente tem que mostrar talento. Eles achavam que iriam colocar público no estádio só com beleza, mas acho que o tiro saiu pela culatra”, afirmou Sissi em entrevista às dibradoras. 

Sissi ganhou o reconhecimento e o respeito que tanto merecia quando se mudou para os Estados Unidos e passou a defender equipes por lá. Hoje, ela é treinadora de uma equipe feminina de base, mas é inegável que faltou ser abraçada e valorizada pelo país em que nasceu.

Em 2017, foi considerada a quinta maior jogadora século pela Federação Internacional de História e Estatística do Futebol (IFFHS) – Pretinha e Roseli são as outras brasileiras da lista de 33 nomes. Mas a decepção maior é ver toda essa história ser esquecida e ignorada, sem qualquer reconhecimento por quem a construiu. 

 

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