Como Renato fez elencos limitados se tornarem vencedores no Grêmio

Foto: Reuters

É difícil sentenciar a resposta para isso, mas aposto que essa é a pergunta que todo mundo se faz olhando o elenco do Grêmio comandado por Renato Gaúcho. Pela terceira vez consecutiva em uma semifinal de Libertadores e também disputando a vaga na decisão da Copa do Brasil (com a vantagem de ter vencido o primeiro duelo contra o Athlético-PR por 2 a 0) nesta quarta-feira, o Tricolor Gaúcho tem um investimento bem inferior ao dos times mais ricos do Brasil, mas está sempre brigando por títulos desde a chegada do comandante ídolo que já virou até estátua no clube.

O que será que os são-paulinos responderiam se dissessem que o Cortez e Cícero seriam protagonistas de um time campeão da América? E o que os palmeirenses diriam se alguém previsse que Lucas Barrios seria destaque de uma campanha vitoriosa na mesma Libertadores? Os flamenguistas, o que falariam se soubessem que Leo Moura, aos 39 anos, conquistaria o título mais importante da carreira?

Poderia citar aqui outros inúmeros renegados, como André “balada”, Jael “cruel” e Fernandinho, que já deixaram o time, o próprio Paulo Victor, que já foi muito criticado nos tempos de Flamengo. A verdade é que, nos últimos três anos, Renato Gaúcho nunca teve “o elenco dos sonhos” à disposição no Grêmio. No entanto, não dá para negar (até pelos títulos conquistados) que o Grêmio dele é o time que joga há mais tempo por aqui um futebol “bonito” e interessante de se ver.

A tentativa aqui é responder essa pergunta com a ajuda de quem acompanha mais de perto o trabalho do treinador e ídolo gremista. Renata de Medeiros, repórter do jornal Zero Hora e da Rádio Gaúcha, e Jéssica Maldonado, jornalista da rádio oficial do clube.

Foto: AFP

– ‘Tirar o melhor dos jogadores’

A maior qualidade de um técnico – ou de um gestor, no geral – é justamente conseguir tirar o melhor de cada um dos membros da sua equipe. E aí vale um pouco da ressalva irônica que Renato Gaúcho fez no final de semana a respeito do Flamengo de Jorge Jesus.

“Com R$ 160 milhões para contratar eu monto uma seleção. Daí serei obrigado a jogar bonito e ganhar. O Flamengo tem jogado um belo futebol, mas com aqueles jogadores é obrigação”, disse ele.

Claro que é “mais fácil” fazer um time com jogadores do calibre de Arrascaeta, Everton Ribeiro, Bruno Henrique e Gabriel jogarem um futebol bonito. Mas também é válido dizer os mesmos jogadores sob o comando de Abel Braga também não rendiam tanto. Então a “mão do especialista” faz diferença. Mas e o Renato? Qual é o segredo para ele tirar o melhor de um elenco que é bem mais limitado tecnicamente?

Foto: Divulgação Grêmio

“O maior mérito do Renato acredito que esteja na gestão de grupo e na gestão individual também. Ele consegue fazer com que os jogadores rendam o seu máximo. Ele conseguiu recuperar o Ramiro, um jogador muito contestado nas últimas temporadas, e conseguiu transformá-lo no grande motor daquele meio-de-campo dele. O mesmo aconteceu com o Cícero, que fez gol em final de Libertadores. Acredito que ele consegue pela gestão, por ter sido atleta e ter muito conhecimento de bola, ele consegue tirar o melhor de cada jogador, principalmente fortalecendo esse fator psicológico”, afirmou Renata de Medeiros.

“Além de ele conseguir aplicar boas ideias de futebol, ele consegue fazer o Grêmio jogar bem. Ele não é só gestão de grupo, tem muito conhecimento de tática e técnica que ele consegue aplicar na equipe e tirar o máximo dos jogadores”, completou.

Esse poder motivacional que Renato tem com seus atletas fica visível nos momentos mais difíceis em campo. Por exemplo, na final do Campeonato Gaúcho deste ano, contra o Inter, André teve um pênalti desperdiçado durante o jogo que poderia ter custado o título. Aí na disputa de penais após o tempo regulamentar, Renato deixou que o mesmo André tivesse a cobrança decisiva. Ele se redimiu e garantiu a conquista para o Grêmio.

“A questão de recuperar jogadores tem muito a ver com a confiança que ele deposita neles. Ao contrário do que acontece em alguns outros clubes, ele confia e sabe transmitir isso para os atletas. Ele dá a oportunidade e, mesmo que o rendimento de determinado atleta em um jogo não seja o que todos esperam, ele vai lá e banca o jogador de novo num próximo jogo”, pontuou Jéssica Maldonado.

Foto: AFP

– Reestruturação financeira e aproveitamento da base

Quando Renato Gaúcho assumiu o clube, o Grêmio vivia uma seca de títulos e tinha bastante dificuldade de se manter competitivo por conta da limitação orçamentária.

O fato de o técnico agora ser um ídolo absoluto do clube deu mais respaldo a ele para trabalhar, e tempo ao clube para se estruturar. O resultado foi uma fórmula excelente para o sucesso: o aproveitamento das crias da base no time profissional, que renderia não só títulos, mas também boas cifras aos cofres gremistas.

“Acho que houve uma conjunção de boas notícias no Grêmio nesse momento do Renato, e uma delas foi o equilíbrio das finanças, com uma gestão mais equilibrada, o que deu condições ao clube de formar grandes jogadores nesse período. A gente viu isso com Pedro Rocha, que rendeu bom dinheiro, com o Jaílson, volante, que também rendeu boas cifras, e o Arthur, o maior dos exemplos. Quando o Grêmio conseguiu se estruturar financeiramente, a base se fortaleceu revelando talentos para o Renato usar e, com o destaque que tiveram no profissional, acabaram rendendo muito dinheiro ao Grêmio”, analisou Renata.

Isso também ajudou na reposição das perdas que o Grêmio teve no elenco nos últimos anos. Sem Arthur e com Luan em má fase, o time ganhou Jean Pyerre (titular absoluto) e Pepê, que veio da base para reforçar o profissional em 2018.

Foto: AGIF

“Acho que a maior força do Grêmio é a coletividade. É o fato de mesmo perdendo alguns atletas, conseguir fazer reposições à altura, mas sem grandes investimentos. E muitas vezes buscar isso em “casa”. Coletividade, também, que mesmo que mude algumas peças do time, não perde a essência e o modo de jogar”, explicou Jéssica.

– Mentalidade vencedora

Para um time que não ganhava um título de maior expressão havia 15 anos, talvez o grande desafio fosse implantar o “espírito vencedor” no elenco. Mas após três anos de trabalho, essa talvez seja uma das características mais notáveis da equipe comandada por Renato Gaúcho. O chamado “time copeiro” hoje é uma realidade no Grêmio.

“Acho que a maior força desse Grêmio do Renato é a mentalidade vencedora. Um grupo talhado para vencer. Que não sente peso de uma decisão. A gente pode ver isso contra o Palmeiras. O time saiu com derrota na arena, saiu perdendo no jogo de volta e conseguiu fazer dois gols com muita naturalidade. O Grêmio já tinha jogado bem durante o jejum, foi até finalista de Libertadores, mas faltava essa mentalidade vencedora que o Renato trouxe”, observou Renata.

Mentalidade esta que será posta a prova mais uma vez nesta quarta, diante do Athlético na Copa do Brasil, e depois em outubro, contra o Flamengo pelas semifinais da Libertadores.

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