A treinadora Pia Sundhage fez sua primeira convocação da seleção brasileira feminina com poucas novidades com relação ao time de Vadão. Dos 23 nomes chamados, 18 estiveram na lista do ex-treinador para a Copa do Mundo. Mas isso não significa que ela não planeje mudanças no esquema de jogo. Muito pelo contrário.
Era um pouco óbvio que Pia fosse manter a base já existente da seleção porque está em um início de trabalho em que conhece pouco do futebol feminino brasileiro. Não dá para exigir de uma treinadora estrangeira o conhecimento aprofundado sobre todos os destaques da modalidade por aqui – até porque, ao contrário do que acontece no futebol masculino, que já é totalmente globalizado, com torneios de todos os países sendo transmitidos no mundo todo, no feminino é quase impossível acompanhar jogos delas fora das fronteiras brasileiras. Até mesmo por aqui era difícil até pouco tempo atrás – as transmissões do Brasileiro feminino só entraram na TV no fim de maio e também não eram todos os jogos que eram transmitidos via internet.
Mas vale ressaltar que Pia reconheceu a importância do cenário local e chamou algumas jogadoras que têm sido destaques de alguns dos principais clubes por aqui. Ela acompanhou o jogo entre Internacional e Flamengo no Rio Grande do Sul no fim de semana e chamou duas atletas coloradas – que já costumavam figurar nas listas de Vadão, é verdade -, a zagueira Bruna Benites e a lateral Fabiana.
Do Corinthians, que só vence há 27 jogos, foram chamadas a zagueira Érika, a lateral Tamires (ambas foram ao Mundial), e como novidade veio a artilheira do Brasileiro, Millene, que tem 18 gols no torneio. Além delas, o nome que chamou mais a atenção – e a única que teve convocação inédita para a seleção principal – foi Yayá, a meia de 17 anos do São Paulo que fez uma partida impecável (incluindo um golaço) contra o Cruzeiro na final da série A2, acompanhada de perto por Pia no último domingo.
Completam a lista de jogadoras atuando no Brasil a goleira Barbara e a zagueira Monica.
Estilo de jogo
O que esperávamos de diferente era o número de meio-campistas convocadas. Na seleção de Vadão, chamava a atenção o número pequeno de atletas chamadas para o meio-campo em contraste com o grande número de jogadoras para o ataque. Mas isso tinha muito a ver com o estilo de jogo do treinador, que atuava em um 4-2-4, com ligações direta e sem a necessidade da bola passar pelo meio-campo. Perguntamos à Pia se era esse o estilo que ela pretendia manter na seleção brasileira.
“Ainda é cedo para falar sobre o novo esquema tático, mas eu quero encontrar formas de preencher o meio de campo para dar ritmo ao jogo. Acredito que é ali o setor do campo em que se cria o ritmo da equipe. O Brasil na Copa tinha muita velocidade pelos lados, mas não tinha meio-campo. Precisamos encontrar jogadoras habilidosas para esse setor. Espero que venha algo diferente aí”, disse Pia sobre uma das mudanças que pretende implementar na forma da seleção brasileira jogar.
Como boas opções para esse meio-campo habilidoso, ela já pode observar Gabi Zanotti, camisa 10 e cérebro do Corinthians em campo, Victoria, outro destaque do time alvinegro; Carla, craque do Palmeiras; as jovens Ary, camisa 10 e capitã do São Paulo, e Duda, que também é camisa 10 e destaque absoluto do Cruzeiro; as meio-campistas do Santos Angelina e Maria; e tantas outras que atuam por aqui. Não seria surpresa vê-las nas próximas listas, e a sueca reforçou isso na entrevista: “Entendo a ansiedade, mas sejam pacientes. As mudanças vão vir”.
Além disso, um aspecto reforçado por ela na coletiva de imprensa foi a necessidade de o Brasil se defender melhor. Esse foi um dos setores da seleção que mais recebeu críticas na Copa do Mundo – a imprensa francesa falou bastante sobre a defesa frágil do time comandado por Vadão antes da partida em que as duas equipes se enfrentaram nas oitavas-de-final. No esquema de Pia, ela cobrará um empenho defensivo maior de todas as jogadoras, principalmente na hora da perda da posse de bola.
“Espero uma atitude um pouco diferente na defesa. De onde eu venho, todas as jogadoras cumprem uma função defensiva quando o time não está com a bola. Todas têm um papel na hora de tentar recuperá-la. Dessa forma, a tendência é que a gente fique mais perto da bola e, quando recuperamos a posse, podemos fazer jogadas de pé em pé, com passes mais curtos para construir o ataque. Vai levar um tempo, mas aos poucos as pessoas verão as mudanças”, destacou a treinadora sueca.
Aí Pia indicou que deve mudar o tipo de jogo que foi visto na seleção da Copa do Mundo. A característica da equipe comandada por Vadão sempre foi a velocidade, e os gols da seleção brasileira em sua maioria foram fruto de jogadas originadas assim, pelo lado do campo. O problema é que quando havia uma marcação mais forte, as jogadoras forçavam o passe longo e erravam, dando assim a oportunidade do contra-ataque para as adversárias. E, nesse caso, pela ausência de jogadoras no meio-campo, a defesa ficava exposta e deixava espaços que favoreciam os oponentes.
A ideia da sueca é ter passes mais curtos, com menor probabilidade de erro. Aproximar as jogadoras como um todo no campo para que a transição do meio para frente aconteça de maneira mais eficiente.
“As jogadoras brasileiras têm muita técnica, são imprevisíveis, e isso é muito legal. Mas precisamos melhorar a transição entre ataque e defesa. Vocês têm jogadoras muito técnicas. E se você tem a técnica, você tem inúmeras formas para mudar a tática da equipe. Espero fazer algo que seja incrível”, observou Pia.
Expectativas
Ainda não dá para exigir que o time mude do dia para a noite e que Pia faça uma transformação absoluta nesses primeiros amistosos da seleção brasileira sob o seu comando (a estreia dela será dia 29 de agosto contra a Argentina no Pacaembu às 21h30). Mas nessa convocação, já foi possível ter uma noção da ideia que ela tem para o Brasil render seu máximo dentro de campo. Como sempre dissemos, talento nunca nos faltou, o que falta é trabalhar o potencial máximo de todas as craques que criamos por aqui.
Vale destacar também que a sueca trabalhará em sintonia com as seleções sub-17 e sub-20, uma integração que era mais do que necessária para garantir uma renovação para a seleção brasileira.
Diante de tudo isso, não dá para negar que primeiras impressões de Pia no comando da seleção são bastante promissoras.