*Por Juliana Lisboa, para a coluna ~dibres com dendê
Em 2018, o Sport, um dos quatro dos representantes nordestinos da Série A, teve um orçamento de R$ 108.382.297 para a temporada. Desses, R$ 600 mil foram para bancar a equipe feminina do clube, que sagrou-se bicampeã do Campeonato Pernambucano, campeã da Copa do Nordeste e se manteve na Série A1 do Brasileirão em dois anos.
A equipe masculina foi rebaixada para a Série B. E, com isso, veio um rombo no orçamento: as cotas de TV vão cair bastante, para algo em torno de R$ 7 milhões (o clube ainda negocia com a Globo e a CBF novos valores), houve perda de patrocínio com a saída da Caixa, premiação menor (especialmente com a eliminação precoce da Copa do Brasil, o que significava boa parte do orçamento deste ano)… E, de quebra, uma dívida histórica, que chegou a R$ 118 milhões na apresentação do balanço financeiro do ano passado. O resultado é que, no final de fevereiro, o Sport ainda não tem orçamento pronto.
Com todos esses perrengues, é compreensível que a nova diretoria queira cortar custos. Mas aí veio a notícia que tanto incomodou: sem mesmo uma tentativa de readequar o investimento no time feminino, a diretoria optou por acabar com a equipe. A justificativa, claro, foi financeira.
Só que a movimentação que o Sport vem fazendo nos últimos dias apontou coisa diferente: o rubro-negro contratou o técnico Guto Ferreira (ex-Bahia e ex-Chapeconse em 2018) e sua comissão técnica – segundo a diretoria, pelos mesmos valores do técnico anterior – e, agora, tenta ‘repatriar’ Diego Souza por R$ 100 mil por mês – isso porque o atacante, que atualmente recebe R$ 600 mil mensais no São Paulo, abriria mão de R$ 200 mil no salário, com o tricolor paulista completando R$ 300 mil.
Sem dúvidas, Diego Souza é um jogador que agrega, que tem qualidade e também identificação com a torcida. Boa parte o considera ídolo: só nas duas primeiras passagens do ex-seleção brasileira pelo Leão da Ilha, foram 173 partidas e 57 gols marcados, (38 pela Série A). Com 14 gols, ele dividiu a artilharia do Brasileirão em 2016 com Fred (Fluminense) e William Pottker (Ponte Preta). Em 2017 foi campeão estadual e convocado para a seleção.
Mas, para um clube que está em dificuldades financeiras, que abriu mão de uma equipe feminina vencedora que joga a primeira divisão, não seria mais interessante procurar atletas mais baratos? Com menos grife? Ou, trocando em miúdos, um que, sozinho, não custe mais do dobro do que um plantel inteiro? Ao que parece, o que falta no Sport não é tão somente dinheiro. É planejamento. É entender melhor qual seria sua prioridade para a temporada de 2019 e traçar a melhor estratégia para concretizá-la.
No ano passado, por exemplo, o Sport teve nada menos que quatro treinadores ao longo do ano: Nelsinho Baptista, Claudinei Oliveira, Eduardo Baptista e Milton Mendes. Todos saíram antes do término de seus contratos, ou seja, só o erro estratégico no comando técnico já rendeu muito dinheiro perdido em multas rescisórias e um rebaixamento no fim do ano. Só esses valores aí já ultrapassam e muito o investimento no futebol feminino (de R$ 600 mil NO ANO).
Fora que essa atitude é um drible com prazo de validade curtíssimo. A exigência de uma equipe feminina será realidade para a Série B em 2020. Então, subindo ou não subindo para a Série A, o Sport terá que retomar (ainda que forçado) o time no ano que vem – isso se não for rebaixado para a Série C. E aí terá que começar do zero, com novas jogadoras, novos contratos, novas campanhas. Com a competitividade crescendo no futebol feminino graças aos novos times que apareceram, retornar à elite não será tarefa fácil.
Isso sem falar da falta de sensibilidade com as atletas que já tinham se comprometido com o clube nesta temporada, e que foram pegas de surpresa com a descontinuidade da equipe. Vale lembrar que o Sport tinha no elenco a atacante Nycole, promessa do futebol feminino que estava sendo observada pela seleção brasileira.
O Sport não é o único time nordestino rebaixado que enfrenta problemas financeiros. O Vitória – por sinal, outro leão rubro-negro – vive o mesmíssimo drama, e também tem uma equipe feminina na Série A1. Só que o Leão da Barra, em vez de acabar com a equipe, manteve o investimento, ainda que provavelmente reduzido. Assim como o Sport, o Vitória ainda não teve um orçamento detalhado aprovado (o valor aprovado foi fixado em R$ 45 milhões), e montante destinado ao futebol feminino não foi disponibilizado.
Mas dá para mostrar que não é acabando com uma equipe inteira – e que custa tão pouco, se comparado com o masculino profissional – que se garante a salvação do rombo financeiro dos clubes. Em vez de pensar em eliminar projetos, a saída mais interessante poderia ser otimizar contratações e reforçar o planejamento anual e a longo prazo. Aí, sim, incluindo o futebol feminino.