Um clube italiano da terceira divisão chamado Virtus Vicenza ganhou as manchetes dos jornais esportivos do mundo todo após ter adotado uma nova estratégia para os gandulas dos seus jogos. A mudança chamou a atenção: saíram os homens responsáveis por pegarem as bolas na beira do campo, entraram meninas de 14, 15 e 16 anos vestidas em short curto e blusa justa para cumprir a mesma função.
As adolescentes fazem parte do time de vôlei sub-16 do mesmo clube, e a ideia, segundo o presidente do Virtus Vicenza, Renzo Rosso (que também é dono da marca Diesel, aquela que as meninas estão vestindo para cumprir a função de gandulas), é “trazer visibilidade para o esporte feminino”.
Abrindo um parênteses rápido: (interessante que esse também é o nosso objetivo com esse blog. No entanto, nunca pensamos em sexualizar a imagem de atletas adolescentes para conseguir cumpri-lo. Por que será?)
E qual é o problema dessa “estratégia”?
Primeiramente, nunca vi ninguém que quisesse trazer visibilidade para um esporte masculino, por exemplo, utilizar homens sem camisa sarados para isso. Será que se o Virtus Vicenza tivesse interesse em divulgar o time de vôlei masculino do clube eles adotariam a mesma estratégia? E se não fariam o mesmo com os homens, por que fazer isso com mulheres – que são menores de idade, aliás?
Mas esse é só um primeiro ponto. Vamos pensar nos seguintes: de que maneira expor meninas adolescentes em roupas justas num jogo de futebol poderia efetivamente alavancar o time de vôlei do qual elas fazem parte? Provavelmente, as pessoas da arquibancada sequer sabem que elas são atletas do clube ou que jogam alguma coisa, já que a única coisa que está exposta ali são seus corpos – e não seu talento esportivo. Será que o objetivo do clube é que o público do futebol se interesse pelo time de vôlei ou pelos dotes físicos das atletas?
Além do mais, é preciso considerar as consequências que uma ação desse tipo pode trazer para as meninas em questão. De novo, elas são menores de idade. Já sabemos o que as mulheres ouvem quando vão ao estádio, os comentários assediosos, grosseiros, violentos até. Que vai de “gostosa” até coisas bem mais baixas de cunho sexual. Imagina então o que ouvem essas garotas adolescentes na beira do gramado dos homens que se julgam no direito de falar de seus corpos como se fosse objetos ali dispostos a servi-los.
“Ah, mas as meninas não estão ali obrigadas, elas acataram a ideia”, vão dizer. Provavelmente elas não estão mesmo sendo obrigadas a fazer isso. Mas não é a atitude delas que precisa ser questionada, e sim a de um clube que vê como “estratégia de divulgação do esporte feminino” a exposição de adolescentes com poucas roupas na beira do gramado.
Nós sempre defendemos a ideia de que mulheres podem usar as roupas que quiserem E onde quiserem, porque isso é o que representa, por essência, a liberdade que buscamos – nós temos o direito de andar por onde quisermos com as roupas que bem entendermos sem sermos assediadas, violentadas, estupradas. Mas o ponto aqui não é esse. É a atitude de um clube de futebol sexualizado garotas com a justificativa de que isso ajudaria a “trazer visibilidade para o esporte feminino”.
Divulgar o esporte de mulheres não é divulgar seus corpos, é divulgar seus talentos nas quadras, no campo, nas piscinas. É falar sobre as equipes femininas no site do clube, transmitir as competições delas nas redes sociais. É fazer propaganda delas com outdoors pelo clube ou então levá-las mesmo ao gramado em um dia de jogo – só que vestidas com o uniforme do time, como jogadoras de vôlei que são.
Há inúmeras formas e estratégias que podem ser adotadas para trazer visibilidade para o esporte feminino. A sexualização das mulheres – das garotas adolescentes no caso – não pode ser uma delas.
Nota: A Associação de Atletas da Itália repudiou a atitude do Virtus Vicenza e fez um apelo à Federação Italiana de Futebol para acabar com um “indigno espetáculo de sexualização de menores”. O time de vôlei em questão, por sua vez, se manifestou dizendo que “não pretende expor as meninas a críticas sobre as quais elas não têm culpa” e que as “roupas usadas pelas garotas são comumente usadas no cotidiano dos adolescentes”.