A atacante Cristiane está de volta à Vila Belmiro. Quase dez anos após sua última passagem em 2011, a artilheira da seleção brasileira volta a fazer parte das Sereias da Vila, em um momento bem diferente do futebol feminino no Brasil. Se naquela época, a atacante deixou o Santos poucos meses antes da pior notícia para as jogadoras – o clube encerrou as atividades da equipe feminina no fim daquele ano -, desta vez não existe a menor chance disso acontecer. Até porque o futebol feminino virou obrigatório para os times de camisa (para cumprir as regras de Conmebol e CBF). Mas independentemente disso, a modalidade vem numa crescente de desenvolvimento em todo o país.
Cristiane apostou nesse crescimento ainda em 2019, quando decidiu voltar a atuar no Brasil e apostou no projeto do São Paulo, que retornava ao futebol feminino após anos sem investir nas mulheres. Lá, jogou pouco por conta de lesões e compromissos com a seleção brasileira – foram apenas nove jogos em todo o ano – e acabou encerrando sua passagem sem ao menos uma reunião final. Agora, para esta temporada, Cris vê nas Sereias da Vila uma nova oportunidade para escrever uma história vitoriosa no clube que já fez parte de sua carreira e onde deixou inúmeros recordes – com a camisa santista, Cristiane se tornou a maior artilheira da história da Libertadores feminina com 15 gols na edição de 2009, e hoje é a quinta maior artilheira do clube no futebol feminino com 46 gols em 29 jogos (média de 1,5 por jogo).
“É um namoro antigo, houve conversas no passado, estou muito feliz com esse retorno. Nós tentamos uma conversa (com o São Paulo) e ela não aconteceu. Aqui, eles me mostraram a estrutura, já melhorou bastante. A gente sabe o quanto o torcedor gosta, tem muito carinho por nós. Eles foram francos, esse olho no olho é muito importante. E eles sabem que se faltar alguma coisa a gente vai conversar. Do tempo que eu passei aqui, nunca faltou nada. Não posso falar pelas que saíram, mas eles foram bastante francos comigo quanto a tudo”, afirmou Cristiane.
O Santos foi pioneiro no retorno à modalidade em 2015, quando passou a já oferecer carteira assinada para as jogadoras (algo muito raro até hoje no futebol feminino). Mas com a saída do presidente Modesto Roma – que sempre foi um grande incentivador da equipe feminina -, houve algumas mudanças na estrutura oferecida para as atletas. Se antes elas dividiam o CT com a base e jogavam na Vila Belmiro, em 2019 as coisas não foram bem assim.
Boa parte dos jogos foram mandados no estádio Ulrico Mursa (com gramado muito pior) – incluindo as quartas de final do Brasileiro – e o local de treinos também variou. Ainda houve a saída da técnica Emily Lima antes das semifinais do Paulista e algumas incertezas sobre o projeto para esta temporada. Foram 19 atletas que saíram de um ano para o outro, mas agora o Santos parece disposto a mostrar um projeto forte de novo, inclusive com o retorno de Cristiane. A atacante será uma das vozes fortes ali para garantir que as promessas virem realidade.
O presidente José Carlos Perez admitiu que o futebol feminino merece mais atenção do clube e da mídia também. Ele disse que vai “lutar” para que elas joguem na Vila Belmiro, mas não garantiu que essa será a casa das Sereias da Vila em 2020.
“A intenção é que jogue na Vila também. No ano de 2019 tivemos um treinador que achava que só ele poderia jogar na Vila. Nós acabamos cedendo a isso. Mas nós vamos lutar pra que elas também tenham direito de jogar na Vila que é a nossa casa”, afirmou o presidente santista, justificando que o técnico Jorge Sampaoli seria o responsável por ter tirado os jogos femininos do estádio.
“Elas merecem ter uma atenção maior do que tem hoje, a gente reconhece isso. Elas são heroínas de praticar um esporte que deveria ter muito mais apoio do que tem. Vocês da mídia são importantes para isso também”, afirmou José Carlos Peres.
No Santos, Cristiane já conquistou uma Copa do Brasil (2009), duas Libertadores (2009 e 2010) e fez parte de um time histórico ao lado de Marta e outras craques que lotavam a Vila Belmiro em seus jogos.
A reestreia de Cristiane pelo Santos deverá ser logo na primeira rodada do Campeonato Brasileiro na série A1, que está programada para acontecer no próximo dia 8 de fevereiro, contra o Flamengo, ainda sem local definido. O clube começa a temporada com um elenco de 28 atletas (duas a mais que ano passado) e uma reformulação completa (saíram 19, chegaram 15). Os reforços serão anunciados oficialmente ao longo dos próximos dias. Alguns deles serão: a zagueira Tayla, as meio-campistas Thaisinha e Brena,
as zagueiras Andressa Pereira e Day, a lateral Fernanda Palermo, as meias Gaby e Bia Menezes e a atacante Larissa.
Outra coisa importante é que o Santos terá uma auxiliar técnica nova. Sandra Santos, que já trabalhou na seleção brasileira com Emily Lima, fará parte da comissão do técnico Guilherme Giudice. Além dela, a goleira Pati Nardy, que se aposentou em 2019, será a nova preparadora de goleiras das Sereias. E a coordenação das categorias de base também será assumida por uma ex-jogadora que já acumula experiência dentro e fora dos gramados. São mulheres competentes assumindo a gestão do futebol feminino no clube.
Ataques nas redes sociais
Cristiane falou também sobre os ataques que recebeu de torcedores na sua saída do São Paulo. A jogadora chegou a fazer um desabafo em suas redes sociais, mas depois apagou. Uma página vinculada a um grupo de torcedores do São Paulo fez uma postagem criticando a jogadora por não ter ficado no clube e, a partir daí, ela recebeu inúmeras mensagens ofensivas em suas redes sociais.
“Foi difícil porque eu recebi críticas ofensivas e maldosas. Como eu falei, isso é diferente de criticar. Foi maldade. As pessoas não sabem o que está acontecendo, pegou o bonde andando sem nem saber de história nenhuma e vai na onda. Quando você tem muitos seguidores, você influencia as pessoas com o que você fala. Só que você não pode contar uma mentira, inventar uma história sem apurar o que aconteceu. E eu comecei a receber ataques pesados, e isso me fez mal. Aí entra no que eu falei da noção das pessoas. Usa a rede social para fazer o bem, não para ficar atacando atleta”, questionou.
“Atleta tem família, tem os pais, tem sentimento. Independentemente de ser trabalho, ser uma paixão pelo torcedor. Eu fico louca quando você fala uma coisa que não aconteceu. Você tem que sentar na minha frente e questionar o que aconteceu. Acho que as redes sociais são arma para o covarde que fica atrás delas para atacar as pessoas.”
Cristiane evitou falar sobre o São Paulo na coletiva, mas mencionou que tentou uma reunião com o clube antes de sair para discutir uma possível renovação, e os dirigentes não quiseram.