A seleção brasileira chegou a abrir 2 a 0 diante da Austrália, mas tomou um gol no finzinho do primeiro tempo e a virada no segundo. Resultado: uma derrota por 3 a 2 e a necessidade de vitória diante da Itália para se classificar.
É verdade que já se imaginava que o Brasil poderia perder para a Austrália por conta dos últimos resultados ruins e pela falta de desempenho em campo do time de Vadão. Mas quando o time abriu 2 a 0 jogando um futebol inteligente, segurando a Austrália e sabendo sair para o jogo para chegar na área adversária, deu para acreditar que ali poderia vir a vitória brasileira e um novo momento para a seleção. A derrota de virada foi um banho de água fria que doeu nas jogadoras. Todas saíram de campo demonstrando revolta com a partida – não por conta de eventuais erros de arbitragem, mas por não terem se conformado que deixaram escapar esse resultado.
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“Não dá pra você tomar um gol faltando um minuto pra ir para o descanso. É imperdoável. Aí o jogo que estava totalmente no nosso controle ficou totalmente aberto. A gente tinha o jogo na mão e perdeu. Não soubemos controlar o resultado”, afirmou Andressa Alves na zona mista.
Cristiane também reconheceu a queda de rendimento do Brasil no segundo tempo. Ela fala sobre o peso das substituições – Marta e Formiga saíram no intervalo por questões físicas -, mas ressalta que isso não deveria justificar os erros cometidos na etapa final.
“Não sei se, na hora da troca, as meninas ficaram um pouco perdidas para encaixar umas no lugar das outras, mas é uma coisa que não dá pra acontecer. Se sai a Formiga, se sai eu, todo mundo tem que entender o que deve fazer. Não vou colocar culpa em quem entrou, quem saiu, é um erro coletivo”, pontuou a camisa 11.
Marta, que voltou a jogar nesta quinta após se recuperar da lesão na coxa esquerda, também foi incisiva na hora de avaliar o jogo.
“Começamos bem o jogo, pecamos no finalzinho do primeiro tempo. Deixamos elas fazerem o gol e isso levantou a equipe delas. A gente tinha que ter voltado ligada o tempo inteiro, aconteceram algumas falhas, e elas fizeram gols muito baratos. A gente deveria ter voltado com o alerta ligado. Estávamos marcando, deixávamos elas quebrarem e saíamos no contra-ataque. Demos chance pra elas sufocarem a gente até sair o gol. É uma situação que podemos corrigir. Não tem nada perdido”, afirmou Marta.
Mas na coletiva, a postura de Vadão foi um pouco diferente. Na beirada do campo, o treinador já não costuma ter uma postura muito agitada, não é de gritar ou chamar a atenção das jogadoras. Ele tem o hábito de chamar uma ou outra para o lado do campo para orientar e pedir alguma mudança de posicionamento, mas nada foge muito disso. Em sua fala à imprensa pós jogo, também adotou uma postura mais “passiva”, falando de uma “normalidade” na derrota por “erros pontuais” cometidos em campo.
“Sentimento nosso é normal de derrota. Fizemos um bom jogo, temos que encarar com naturalidade, não acabou nada. Hoje a gente teve grande oportunidade, mas perdemos”, disse.
“Mesmo a gente não repetindo a mesma atuação (no segundo tempo) foram gols que não foram em bolas trabalhadas. Duas bolas jogadas na área sem muita pretensão. Eu não acho que não jogamos nada. Tivemos chance também no segundo tempo, duas escapadas com a Debinha. Mas não jogamos como foi no primeiro tempo”, analisou.
A avaliação geral de Vadão para a imprensa foi que o Brasil jogou bem o primeiro tempo, teve erros pontuais no segundo e saiu derrotado. Mas para um time que estava ganhando de 2 a 0 e terminou o jogo levando a virada, era de se esperar um pouco mais de autocrítica nesse momento – essa que foi feita pelas jogadoras, mas não pelo treinador.
A revolta de Andressa na zona mista mostrou o quanto as atletas saíram de campo inconformadas com a derrota. É isso: não dá pra tomar um gol aos 46 do primeiro tempo, não dá pra abrir 2 a 0 e levar a virada. Não dá pra tratar isso como “normal”.
Já há algum tempo, Vadão parece tentar “maquiar” seus erros com declarações de quem parece não ter visto o mesmo jogo que todos nós. Nas nove derrotas acumuladas antes da Copa, o treinador insistia que a seleção perdia por “erros pontuais”, “uma bola que a menina teve a felicidade de acertar”, “um chute que elas tiveram a felicidade de concluir”, etc, etc. Só que os “erros pontuais” se multiplicam em 10 derrotas nos últimos 12 jogos. Erros principalmente de posicionamento na defesa. É exatamente como as jogadoras analisaram: a Austrália teve pouco mérito nos gols que fez. Ela não trabalhou a bola, encontrou espaços e construiu jogadas para fazer essa virada. Ela simplesmente se aproveitou de erros do Brasil que se repetem há bastante tempo desde que o técnico está no comando.
Não esperava que Vadão chegasse na coletiva e apontasse os erros individuais de posicionamento das atletas. Mas esperava, sim, que ele admitisse seus próprios erros. Que admitisse que o Brasil voltou para o segundo tempo irreconhecível. E que isso não pode acontecer, independentemente da ausência de Marta e Formiga, que pediram pra sair. Que admitisse que poderia ter mexido melhor, que seu meio-campo ficou sem criação sem Marta em campo e que explicasse por que Andressinha nunca é uma opção pra ele nesse setor.
Enquanto as jogadoras saíram de campo assumindo sua parcela de erro, admitindo as falhas, com a cabeça erguida e, ao mesmo tempo, revoltadas por terem deixado escapar um resultado que construíram em campo, o técnico pareceu passivo demais mais uma vez, como se perder pra ele nessa seleção fosse “normal”. Não tem que ser, não pode ser. Temos a melhor jogadora do mundo, a artilheira da Copa, a artilheira da Olimpíada, a recordista de Mundiais. Temos o talento de Andressa Alves, de Tamires que engoliu sua marcadora australiana, de Thaísa que segurou muito bem o meio-campo. Não dá pra aceitar tão facilmente assistir a uma virada como a de ontem sem se revoltar com ela. Derrotas acontecem, sim, e acontecerão eventualmente, mas nessa diante da Austrália, o Brasil não perdeu para suas adversárias – perdeu pra si próprio, como bem avaliou Andressa na saída de campo.
Não é novidade que Vadão não esteja preparado e não seja a pessoa certa para estar no comando da seleção neste momento. Ele demonstra isso já há algum tempo, inclusive com o acúmulo da pior sequência da seleção brasileira na história (9 derrotas consecutivas). Ninguém o tirou de lá antes da Copa, algo que até agora estamos tentando entender, já que em qualquer outro clube ou seleção (masculina), isso aconteceria. A Austrália trocou de técnico em fevereiro e evoluiu muito de lá pra cá.
De todas as formas, é preciso ressaltar a coragem dessas jogadoras por não fugirem da raia e assumirem seus erros após a virada. Assim como demonstraram no primeiro tempo contra a Austrália, elas têm muito futebol pra mostrar e podem perfeitamente, por seu próprio mérito, garantir a classificação contra a Itália e seguir em frente nesta Copa deixando para trás os erros do passado.