Sem clube após auge em 2016, Bárbara quase parou, mas hoje vai para 4ª Copa

Foto: AFP

Em 2016, nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, Bárbara foi um dos destaques da seleção brasileira e foi diretamente uma das responsáveis pelo time chegar às semifinais. Quando Marta perdeu seu pênalti na disputa que valia a vaga contra a Austrália, o Brasil estaria fora caso a australiana fizesse o gol. A goleira não só defendeu essa, como mais uma cobrança e assegurou a classificação.

Depois, nas semifinais contra a Suécia, mais uma disputa de pênaltis, e de novo Bárbara chegou a postergar a eliminação com uma defesa crucial após Cristiane ter perdido o dela, mas não conseguiu evitar a derrota. De todas as formas, a goleira encerrou a Olimpíada mostrando estar no auge da carreira, fechando o gol brasileiro. Só que depois dos Jogos, quando a seleção permanente acabou, Bárbara não recebeu propostas e acabou ficando sem clube, treinando sozinha para manter a forma.

“Foi meio revoltante e pensei. Pensei: não posso mais fechar contrato fora do Brasil porque eu preciso estudar. Numa situação dessa, por mais que eu fique sem clube, sem trabalho eu não fico”, afirmou a goleira em entrevista às dibradoras.

Foram seis meses em que ela pensou muito se deveria continuar no futebol ou não. Afinal, durante toda a sua carreira, foram muitas idas e vindas, incertezas a cada fim de temporada para saber se teria ou não emprego no ano seguinte. A realidade do futebol das mulheres era assim – ainda é, de certa forma, para a maioria – e Bábara sentia que estava perdendo tempo. Poderia estar estudando, construindo uma carreira que realmente pudesse lhe dar alguma estabilidade. Mas antes que pudesse desistir, surgiu uma proposta do Kindermann (time de Santa Catarina) e ali ela conseguiu aliar futebol e estudo, então deu para continuar. Sua escolha foi fazer Enfermagem.

“Decidi voltar com o pensamento de estudar porque eu estava vivendo uma fase muito triste da minha vida. Após uma Olimpíada tão boa que eu tinha feito, ficar tanto tempo sem clube. Recebi a proposta do Kindermann em 2017 e conciliou. Quando eu fechei, fiz a minha proposta de estudar Enfermagem (na faculdade que tem parceria com o clube) e eles aceitaram”, contou.

Foto: CBF

Não é tão comum uma atleta escolher essa carreira nos estudos. A maioria delas acaba fazendo Educação Física, que é uma área mais próxima à atividade que desempenham – e porque seria também uma profissão mais fácil para conseguir atuar após a carreira no campo, já que a vivência delas como jogadoras pode contar como experiência. Mas Bárbara apostou em outra paixão. Ela revela que gostaria de estudar Medicina, mas com a vida de atleta seria impossível conciliar por enquanto.

“Optei por enfermagem por estar ligado a área da saúde. Fiz o primeiro ano, segundo e terceiro (2017, 2018 e 2019). Estou no quinto período da faculdade, o mais complicado que estou vivendo. Tem muito estágio e eu não estou conseguindo fazer. Já fiz, no momento o que eu mais gostei foi de estar no centro cirúrgico, de acompanhar muitas cirurgias e ali eu vi que era realmente o que eu gosto. É algo que vou me dedicar até o final da minha vida”, disse.

“Não quero seguir com o futebol porque eu cansei. Não é fácil, você se dedica muito, você ouve e vê muitas coisas e precisa fingir que não está vendo e nem ouvindo e seguir. Por eu ter tido que abrir mão de muitas coisas, por essas situações e frustrações que vivi, eu não quero mais viver no meio do futebol. Quero me estabilizar, voltar pro meu lar, trabalhar, poder ter hora pra chegar na minha casa pra descansar, estar com minha família”.

Da ‘granja’ ao sucesso

Bárbara é de Recife e cresceu com o futebol por conta do convívio com os irmãos mais velhos e o pai, que era jogador. Com apenas 8 anos de idade já jogava futsal e tinha bolsa na escola por isso, e aos 12 foi representar o Sport também nas quadras. Sua primeira experiência no campo foi inusitada e tardia – somente aos 16, quando surgiu um torneio quadrangular na cidade que serviria de peneira para a primeira seleção sub-19 feminina.

“Eu nunca quis jogar campo porque sabia que era muito grande (o gol). Eu falava que não queria. Aí a preparadora de goleiro na época era treinadora da base e de goleira do time principal do futsal e ela me convenceu a treinar. Não tinha atletas suficientes porque o time de futsal é bem menor do que o campo, então treinamos só por dois dias e fomos pro torneio. Essaffoi a primeira vez que joguei no campo e cheguei a pegar um pênalti. Nosso time foi campeão e eu fui convocada”, contou.

(Foto: AFP / GUSTAVO ANDRADE)

Aí veio a parte mais engraçada da história. Bárbara recebeu o convite de ir para a seleção sub-19 na Granja Comary. Mas quando ouviu a palavra “granja”, não entendeu nada. “Na época, falaram que eu ia pra Granja eu fiquei meio sem entender, sabe?! É uma história bem engraçada, eu conto, as pessoas se racham. Porque pra mim granja era onde criavam galinha. Vão me levar pra trabalhar com galinha? Eu nem sonhava que era o centro de treinamento onde os melhores jogadores do Brasil estão e se prepararam. Eu fui falar com o treinador e questionei: ‘mas eu vou trabalhar na granja com galinha?’ Aí que ele explicou e a ficha caiu”, contou aos risos.

Isso aconteceu em 2005. Dali em diante, Bárbara não saiu mais da seleção. Ela foi responsável pela conquista do terceiro lugar na Copa do Mundo Sub-20 pegando três pênaltis na disputa contra os Estados Unidos. Disputou o Sul-Americano de base, depois o principal. Esteve nas Copas de 2007, 2011 e 2015, sempre como reserva. Agora, pela primeira vez será titular em um Mundial.

Fase ruim da seleção

Esse definitivamente não é o melhor momento da seleção brasileira feminina. Com nove derrotas acumuladas na preparação para o Mundial, o Brasil estreia neste domingo diante da Jamaica com o peso de ter perdido quatro titulares por lesão no meio do caminho – Marta, que ainda está no grupo, mas não vai para o jogo, a zagueira Erika, cortada na sexta, a lateral direita Fabi, cortada na semana passada, e a meia-atacante Adriana, cortada logo no dia seguinte à convocação.

Foto: CBF

Mas o momento é de deixar tudo isso para trás, conforme reforça Bárbara. “Acho que o momento é bem delicado sim, não só a questão das derrotas, mas sim do time fixo. O problema não só está na formação tática, no treinador, nas derrotas. O problema está também nas atletas. Em todos os amistosos foram nove derrotas, mas se você analisar os times das nove derrotas, o da primeira foi um, da segunda foi outro, da terceira foi outro. E assim sucessivamente. Sempre vai ter uma atleta que vai se lesionar, vai sentir desconforto e isso acontece. São jogos atrás de jogos em um período muito curto”, opinou.

“Costumo dizer que aprendemos muito nesse momento das nove derrotas, era aquele momento que a gente precisava perder, ter o erro pra poder se ajustar muita coisa. Vontade e determinação não vai faltar, eu e minhas companheiras já estamos respirando essa Copa.”

A expectativa é de fazer um bom Mundial não só pelo sonho do título, mas também para manter os holofotes no futebol feminino. “Tô encerrando minha carreira e quero deixar um legado. E se o legado for esse momento (de visibilidade) que o futebol feminino está vivendo, daqui pra mais, vai ser maravilhoso.”

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