Se você tem dificuldades para fazer mala quando vai tirar férias ou passar um tempo fora de casa e sempre esquece algum item, já imaginou o tamanho da preocupação da pessoa responsável por simplesmente trazer todo o material de uma seleção para a disputa de uma Copa do Mundo?
Esse é o trabalho de André Luis dos Santos, roupeiro das equipes femininas do Brasil há quatro anos, que leva na bagagem literalmente um campeonato inteiro. São dezenas de contêineres e mais contêineres, uma tonelada inteira de material – entre roupas de descanso, de treino, uniformes de jogo, chuteiras, material de fisioterapia, fisiologia, departamento médico, etc, etc, etc. Já imaginou o tamanho do excesso de bagagem?
André precisa chegar com muito mais tempo de antecedência ao aeroporto para garantir que todo esse material seja despachado corretamente.
Mas o principal desafio de quem fica nessa função é realmente ter certeza de que nada está ficando para trás. Para isso, são necessárias checagens e mais checagens, listas e mais listas com todos os itens que precisam ser levados e uma organização metódica em que ele garante ter 100% de aproveitamento.
“Nunca esqueci nenhum item. Há oito anos trabalho com isso. Não dá para esquecer porque senão elas não têm como trabalhar. Elas precisam do material”, explica.
Vai vendo a quantidade de coisas que precisa estar nas malas organizadas por André:
– um uniforme de treino para cada jogadora por dia (são 23 atletas, foram 14 dias de preparação e serão pelo menos mais 23 dias até a primeira fase acabar. Isso daria 851 uniformes de treino).
– há também uma divisão dos uniformes com e sem os logos de patrocínio, porque nos territórios Fifa não é permitido usar nenhuma estampa que remeta a patrocinadores específicos de cada confederação; sendo assim, há também um pacote de uniformes extras desse tipo para as atividades como treinos oficiais no campo do jogo, coletivas de imprensa da Fifa, etc.
– um uniforme de jogo pra cada uma pra cada jogo (23 atletas e pelo menos três jogos, 69 no total).
– roupas de passeio com logos de patrocínio e sem o logo para comissão técnica e comissão médica.
No despacho de bagagem no Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro, foram mais de 60 contêineres com todo esse material. Mas o problema é garantir que tudo isso chegue ao destino final junto com a seleção. “Isso é bem difícil. Porque muitas vezes você faz uma escala, pega um avião menor e não cabe tudo nele. Aí vai chegando picado”.
Foi o que aconteceu no trajeto do Brasil até Portimão, em Portugal, onde seria a preparação para a Copa. A seleção desembarcou em Paris para pegar um voo até Lisboa. O avião para esse trajeto era menor, então não coube tudo o que veio do Brasil. E, quando chegaram ao destino final, faltaram alguns contêineres dos equipamentos de fisioterapia e fisiologia.
“Quando a gente chegou em Portugal, tinha um caminhão lá esperando para transportar tudo para Portimão. Só que nem tudo chegou junto. Meus materiais chegaram só uns três dias depois”, contou o fisiologista da seleção feminina Luciano Capelli.
Se uma pessoa normal que leva bagagem em viagens internacionais muitas vezes acaba perdendo alguma coisa no caminho – porque a mala não chega no destino, imagina então uma seleção que leva 1.000 quilos despachados? É claro que tem coisa que acaba viajando o mundo até finalmente voltar para o destino certo. Foi o que aconteceu desta vez com o tripé do departamento de comunicação da CBF.
“O tripé chegou depois de uma semana quase. Foi para Holanda, Alemanha. Chegou aqui com várias etiquetas de tudo quanto é país pelo qual ele passou. Esse é viajado”, brincou o roupeiro André.
Logística para os jogos
Toda essa logística precisa ser repetida a cada destindo onde a seleção vai para jogar. Então o percurso por enquanto foi Rio de Janeiro, Paris, Lisboa, Portimão. Aí saindo de Portimão, vai para Lille, depois Grenoble, onde o Brasil estreia contra a Jamaica, dia 9 de junho. De lá vai para Montpellier, onde será o segundo jogo contra a Austrália. Depois Lille de novo, onde a seleção concentra para a última partida da primeira fase, vai para Valenciennes para a partida contra a Itália.
Esse é o percurso garantido da seleção – e de toda essa bagagem. Conforme o Brasil for passando de fase, uma nova logística terá de ser feita para transportar tudo de um lugar para o outro, incluindo aviões e caminhões – além da reza certa para garantir que tudo chegue a tempo, sem ficar perdido pelo caminho.
Em dias de jogos, André também tem sua metodologia própria para cuidar do uniforme e material das jogadoras. “Gosto de chegar adiantado para arrumar tudo”, diz. Mas a assessora da seleção logo completa. “Ele chega bem antes. Tipo 3, 4 horas antes”, ela ri.
“Eu gosto de chegar, ver o lugar, arrumar tudo. Às vezes o cabide para colocar a camisa delas é ruim, ele alarga a gola, então eu estou sempre com meus próprios cabides para garantir”, conta André.
O roupeiro, então, coloca camisa, short, meião, deixa a chuteira tinindo para as jogadoras colocarem no pé e fazerem o que mais sabem. “A chuteira tem que cuidar bem né. Eu sempre limpo cada uma delas logo depois dos jogos, tem um cuidado especial”, afirmou.
É ele também quem cuida da lavagem dos uniformes, levando para a lavanderia e conferindo se está tudo certo quando o material é entregue. O problema é que sempre pode ter percalços nessa jornada – como aconteceu no amistoso do Brasil contra a Espanha em abril, quando não havia local para lavagem no hotel e a lavanderia mais próxima era daquelas de auto-serviço: ou seja, ele próprio precisou colocar as moedinhas na máquina e esperar todo o processo de lavagem e secagem, gastando horas ali até conseguir que todo o material ficasse pronto.
O orgulho que ele carrega por fazer parte da seleção brasileira, cuidando para que tudo esteja nos conformes para elas jogarem, é enorme. “É aquilo né? Nada acontece sem o roupeiro. Então me sinto muito feliz de poder fazer parte disso”.