“Olá, vocês podem me ajudar a encontrar um time para jogar?”. “Moro no interior (insira aqui qualquer cidade ou estado) e não encontro meninas para jogar futebol”. “Por favor, como faço para jogar no time de vocês?” Essas são algumas das mensagens mais frequentes que nós, do dibradoras, recebemos de mulheres espalhadas pelo Brasil.
Pensando em sanar parte desse problema que faz parte do cotidiano feminino algumas iniciativas começaram a surgir, uma delas foi criada pelo coletivo de futebol Joga Miga, de São Paulo, chamado Mapa do Futebol Feminino.
“É uma ideia que eu tinha há muito tempo. O maior motivo é que muita gente – eu inclusive – sempre achou difícil encontrar lugares para jogar. Ou ter opções melhores de onde jogar. No Joga Miga recebemos muitas mensagens de mulheres de fora de São Paulo buscando um local e pensei que seria uma boa reunir todos esses lugares num só lugar”, contou às dibradoras, Nayara Perone, fundadora do coletivo que oferece treinos de futebol para as mulheres.
Com o mapa (que em breve se tornará um aplicativo), é possível clicar nos estados e regiões e descobrir onde há lugares para mulheres jogarem futebol.
O jeito mais usado pelas meninas para formar turmas e encontrar quadras para jogar futebol ainda é, geralmente, pelo Whatsapp e grupos do Facebook. Muitas equipes nascem do boca-a-boca, uma amiga puxa a outra, mas nem sempre é fácil de encontrar grupos consolidados e que se comprometam com a prática semanalmente.
Existem dados que ilustram bem essa realidade, como a Pesquisa de Confiança e Puberdade encomendada pela Always em 2016 (feita com meninas entre 16 e 24 anos) que apontou que 74% das meninas entrevistadas sentem que a sociedade não as encoraja a praticar esportes. E essa percepção é totalmente verdadeira. As mulheres enfrentam mais dificuldades para formar grupos e dados da mesma pesquisa mostram que os principais desafios para as meninas que continuam a praticar esportes são de que a maioria das pessoas acreditam que as meninas são piores em esportes do que os rapazes (36%), a falta de incentivo da participação esportiva por amigos ou familiares (35%), e a falta de respeito com as meninas nos esportes (30%).
“Tem muita gente com vontade de jogar, mas sem saber onde ir. Ou que estão jogando num lugar onde não conseguem manter a rotina de treinos. Nosso objetivo sempre foi fomentar a prática do futebol para as mulheres, por isso que disponibilizamos aulas para quem quer começar do zero ou para quem quer aprimorar e jogar conosco. E para isso dar certo, nada melhor que ajudar as pessoas a achar um lugar pra jogar”, afirmou Nayara.
Foi o que aconteceu com Rose Arevalo, que nasceu em Manaus, mas mora em São Paulo há 10 anos e buscava há algum tempo, um time de futebol feminino para jogar. “Quando era criança, jogava futebol na escola e rua de casa, meu pai sempre foi apaixonado por futebol, eu assistia aos jogos com ele e era muito divertido. Ao chegar no Joga Miga, me senti muito acolhida”, contou às dibradoras.
“Me sinto realizada todos os sábados quando estou jogando com as mulheres que fazem a diferença dentro dessa sociedade ainda carregada de muita desigualdade. Nós mulheres seguiremos jogando até que todas sejam livres e tenham seus direitos garantidos por uma sociedade justa”, revelou a jogadora que até ganhou uma chuteira do coletivo como prêmio por ter indicado outras meninas a participarem dos treinos.
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Futebol pela internet
O Mapa do Futebol Feminino é apenas o primeiro passo. Até o final de fevereiro, o Joga Miga pretende lançar um aplicativo gratuito com o objetivo de acolher as mulheres que desejam jogar futebol. Enquanto o aplicativo não está disponível, as meninas podem fazer o cadastro de suas equipes em um formulário disponível no site, divulgando seus treinos: endereço, dias da semana, se é pago ou gratuito, se conta com um treinador e etc.
Depois de cadastrado, a equipe do Joga Miga faz a triagem e cadastra as equipes no mapa. “Tudo foi desenvolvido só por mulheres. Desde a parte da criação e desenvolvimento da programação do site, até a programação do app, triagem e cadastro no sistema do mapa”, disse Nayara.
“Uma das funcionalidades do aplicativo será o acesso mais facilitado ao mapa. Por ali elas poderão entrar em contato com as responsáveis pelo time, treino ou coletivo” explicou Nayara. “As funcionalidades de marcar um amistoso, criar um evento, cadastrar jogadoras e demais parcerias serão lançadas nos meses seguintes, conforme o desenvolvimento da plataforma”, concluiu.
Um aplicativo já consolidado e que cumpre essa função é o Appito. No ar desde 2016, ele também auxilia o usuário a encontrar sua pelada (aqui o foco é tanto masculino como feminino). “Temos 350 mil usuários cadastrados e cerca de 5.500 quadras catalogadas no Appito, a maioria delas são comerciais. Nosso aplicativo também permite que seja cadastrado locais públicos e privados”, contou Guilherme Baldacini, diretor de marketing da plataforma.
Guilherme reforçou que um dos objetivos do Appito para 2019 é focar bastante no público feminino, já que apenas 5% dos acessos são feitos por mulheres. “Estamos planejando uma série de ações e eventos para este ano com o objetivo de promover conversas e receber feedbacks das usuárias.”
Os números apontam que São Paulo é a cidade com mais meninas cadastradas na plataforma, representando 32% do público feminino. Na sequência aparecem as cariocas com 9,5% de cadastradas e empatados com 6% dos acessos estão Minas Gerais, Bahia e Ceará.
Entre as diversas demandas possíveis de serem controladas pelo app, estão: sistema de estatística de jogo, dar e receber notas de outros jogadores, gestão de pagamentos, lista de confirmados, lista com prioridade, eventos avulsos (churrasco, cerveja e a resenha do final) e mural do grupo.
Marina Galante, de 26 anos, é usuária do Appito e também cadastrou seu time – o Intenazionale Di Mooca – no Mapa do Futebol Feminino do Joga Miga. Ela começou a jogar futebol na brincadeira, em um evento do trabalho e pegou gosto pela coisa.
Enfrentou todas as dificuldades possíveis antes de conseguir fechar uma equipe com quórum semanal e contínuo: meninas que desistiam dos treinos por conta de trabalho e aulas na faculdade, falta de dinheiro para pagar a mensalidade, quadras públicas que eram ocupadas pelos meninos enquanto elas jogavam e ausência de vestiário feminino para se trocarem.
Foi por causa delas que o Bolão Centro Esportivo (um espaço de futebol society na Avenida Anhaia Mello em São Paulo) precisou se adaptar para receber as mulheres. “Lá, nós estreamos como as primeiras mensalistas de futebol feminino e eles tiveram que gastar com a criação de um vestiário separado para as meninas”, revelou Marina.
Hoje, a equipe se consolidou, com página no Facebook e local definido para treinos (com o auxílio de um professor). “Não tinha aula de futebol na minha escola. Eu participava das atividades porque valia nota, mas os professores não davam aula. Hoje, com os treinos, eu perdi o medo da bola, melhorei os fundamentos, evolui muito”, contou Marina que ainda divulga sua equipe pelos grupos de Facebook e Whatsapp, mas usa o Appito para organizar a lista de presença das meninas na pelada e passar informações.
Como o mapeamento do Joga Miga ainda está no começo, Nayara e sua equipe estão filtrando os diversos cadastros recebidos e cadastrando cada um no mapa. “No ar temos mais de 50 times cadastrados de diversas partes do Brasil. Temos mais de 100 para publicar ainda. Meu objetivo pessoal é que todos os estados do país cadastrem e indiquem os times para deixar o mapa ainda melhor”, reforçou.